Amo, logo existo
12.06.08
- Isabelle Ludovico
Contrariando Descartes, a essência do ser humano não é a sua capacidade de pensar, mas a sua capacidade de amar, pois fomos criados à imagem de um Deus que é amor. Amar e ser amado é nosso principal desejo. Descobrir-se amado por Deus e deixar-se amar por Ele são condições básicas para amar o outro como a nós mesmos, nem mais nem menos. Quem tem uma auto-imagem negativa tenta conquistar o amor do outro a qualquer custo, mesmo prejudicando-se. Os egoístas acham que o mundo está sempre em dívida com eles e cobram uma atenção que nunca é suficiente para suprir suas necessidades inesgotáveis. Um amor exagerado é nocivo tanto para quem se sacrifica pelo outro e tende a cobrar esta dedicação quanto para quem é superamado e tende a tornar-se dependente ou sentir-se responsável por uma dívida que nunca poderá ser quitada.
Nosso desejo de amor incondicional é sempre frustrado nos nossos relacionamentos humanos porque nossa capacidade de amar é limitada. Por isso, carregamos desde a gestação feridas que vão se acumulando e afetando nossa compreensão do mundo e de nós mesmos. Os mecanismos de defesa que desenvolvemos vão contribuir para reforçar essas interpretações erradas da realidade. Assim, uma pessoa retraída e insegura tende a achar as pessoas hostis e a sentir-se rejeitada. Ela projeta sua própria desconfiança nos outros e acaba provocando justamente aquilo que mais teme.
Precisamos estar atentos às nossas reações para confrontá-las com a realidade. Se reagimos de forma exagerada é porque existe uma ferida que deve ser reconhecida para ser curada. Os problemas não resolvidos tendem a piorar e reforçar as nossas resistências, tornando-nos cada vez mais defensivos. Lutamos contra o mal fora de nós sem perceber que ele está em nós. Às vezes, precisamos que outras pessoas nos sinalizem nossas dificuldades relacionais e nos ajudem a enxergar, como num espelho, essas distorções. Infelizmente, as pessoas mais próximas são tão afetadas que dificilmente conseguem ser um espelho imparcial e amoroso. Nesse caso, procurar ajuda terapêutica não é sinal de fraqueza, mas sim de coragem e maturidade.
Recebemos de Deus um tesouro que é a nossa própria vida: o bem mais precioso que possuímos. Não somos responsáveis pela cara que temos, mas sim pela cara que fazemos. Encarar os fantasmas do passado nos ajuda a enfrentar o presente de peito aberto e construir relacionamentos mais maduros. Cada um de nós é único, uma expressão original do amor de Deus, uma obra-prima da Sua criação que foi desfigurada pelo desamor, mas que Ele deseja restaurar através do resgate da Sua paternidade.
O nosso lugar no mundo também é único. Cada um precisa integrar as experiências da sua história para construir a colcha de retalhos que permite entender o sentido da sua vida. Transformar as vivências negativas em aprendizagem e crescimento permite reverter o mal e dar lugar ao bem. A Bíblia nos convida a considerar todas as coisas e reter o que é bom. Isso requer uma seleção das influências vividas, bem como a determinação de escolher aquilo que pode ser construtivo e nos desfazer daquilo que nos prejudica. Muitas vezes tendemos a fazer o contrário. Damos atenção àquilo que nos machuca e negligenciamos o que deu certo.
O equilíbrio emocional se revela na capacidade de ter reações emocionais compatíveis com suas causas. Ele é necessário nos nossos relacionamentos, na definição de nossas prioridades, para balancear razão e emoção, lazer e trabalho, palavras e ações, talentos naturais e dons sobrenaturais, ser e fazer. Ele não se alcança automaticamente, mas precisa ser buscado através de uma avaliação que permite a correção dos nossos rumos.
Ter por objetivo crescer na fé, esperança e amor é uma meta que Deus irá abençoar. A bênção de Deus nos leva a ir além dos nossos limites naturais porque temos acesso à fonte inesgotável que nos supre e transborda em direção ao outro. A fé nos faz enxergar além desses limites, a esperança nos faz confiar na providência divina para superá-los, e o amor dá sentido à nossa vida. Ter consciência de que somos filhos amados de Deus, criados para vivenciar e expressar este amor, é a chave de uma vida plena e realizada.
Fonte: http://www.revistaenfoque.com.br/index.php?edicao=75&materia=867