O Caráter Cristão
- por Russell P. Shedd
Stephen Neill afirmou diante de líderes aspirantes que "o período mais perigoso na vida de um homem é entre seus 40 e 50 anos. A razão é que, nesta fase as fraquezas se tornam aparentes.
Por isto é tão importante descobrir agora, enquanto somos jovens, quais são as nossas fraquezas íntimas e tratá-las e não permitir que os anos nos desgastem e tornem evidentes nossas fraquezas justamente na hora em que deveríamos nos tornar líderes e pilares na Igreja" (On the Ministry, Londres, SCM Press, 1952, pp. 34-35).
Mais do que nunca devemos refletir sobre nosso caráter. A queda de um líder não ocorre de um dia para outro, mas, como ovos numa incubadora, os pintainhos devem ser previstos. Somos todos vulneráveis, mas quem se arma contra os inimigos da alma tem chance melhor de vencer que os que não se preveniram.
Adão caiu e juntamente com ele nós todos caímos (Rm 5.12). Esse lapso moral e espiritual de tal forma desfigurou o ser humano que ele vive em contradição consigo mesmo. Nenhuma outra criatura sofreu conseqüências tão devastadoras como o homem. O cão não luta para se dominar, nem aspira melhorar, um gato não cai no vício, nem busca a santificação.
Nós fomos criados para voar no meio das estrelas e rastejamos na lama. Que o homem tem potencial para fazer algum bem não podemos negar; porém, somente o mínimo desse potencial se concretiza em atos de amor.
Observamos um defeito profundo no caráter, uma depravação que contamina todo o seu ser. Paulo lamentava que a conversão não consertou de vez este mal.
"Porque eu sei que em mim, isto é na minha carne, não habita bem nenhum, pois o querer o bem está em mim; não, porém o efetuá-lo" (Rm 7.18).
Todo cristão sincero almeja alcançar um caráter excelente e ser uma pessoa aprovada diante de Deus e dos homens (2 Tm 2.15), mas, os escândalos e decepções provocadas por líderes espirituais, devem criar uma desconfiança em nós mesmos.
O Problema: Um Caráter Mal-Desenvolvido
Fortes inimigos conspiram contra os cristãos que aspiram por integridade, confiabilidade, honestidade e transparência. As qualidades que Jesus atribuiu aos bem-aventurados se confrontam com forças antagônicas de tal potência que, se não gozarmos de ajuda divina, não se deve esperar a vitória, Desejo refletir sobre falhas de nosso caráter que devemos combater com especial dedicação.
1. A Soberba
O primeiro inimigo, o mais fundamental, deve ser o orgulho que domina o conceito que criamos de nós mesmos e dos outros. O líder brasileiro tem uma propensão grande para a soberba porque facilmente interpreta seu esforço para vencer os muitos obstáculos na vida como digno de algum mérito.
Um curso superior, uma posição de autoridade sobre os outros, facilmente enche o coração de vaidade, especialmente quando se nota que os colegas e amigos não alcançaram nenhuma posição de influência. A soberba se insinua tão sutilmente que persuadimos a nós mesmos que Deus nos deu uma posição de destaque porque somos melhores do que os outros.
Ecoamos no íntimo a oração do fariseu que se auto-congratulava porque, na sua opinião, merecia reconhecimento da parte de Deus e dos homens. Ficou totalmente cego ao olhar para si mesmo. É tremendamente difícil se auto-avaliar e não concluir que somos melhores do que se poderia esperar.
O Brasil não persegue seus líderes espirituais. O pastor, muitas vezes, tem prestígio na sociedade, até comparável a um profissional liberal.
Mas, as Escrituras advertem contra todo auto-prestígio. A primeira carta a Pedro recomenda:
"Cingi-vos todos de humildade, porque Deus resiste aos soberbos, contudo, aos humildes concede a sua graça" (1 Pe 5.6).
O orgulho é antipático ao caráter íntegro, por duas razões. Pimeiro, o soberbo acha-se incapaz de cair. Não toma providências necessárias para fugir das tentações.
Segundo, a soberba cria um desprezo para os outros, tampando efetivamente os seus ouvidos contra as advertências que poderiam levantar uma cerca eficaz contra o leão feroz (1 Pe 5.8).
2. Liberdade Sexual
A censura do regime militar brasileiro acabou com a devolução do poder aos líderes civis. O resultado se observa nos grandes cartazes da revista Playboy adornando nossas avenidas.
Filmes, novelas, vídeos, programas de TV, juntamente com dezenas de revistas nas bancas, nos deixam atônitos pela falta de pudor. O carnaval e as praias brasileiras conspiram juntamente para derrubar a castidade. Haveria um crente sequer que se defende cuidadosamente destes assaltos à mente pura (At. 5.28)? Haveria um cristão que sente-se envergonhado com a beleza do corpo transformado numa cilada de tentação?
O efeito desta guerra acirrada contra a pureza, parece ser destruição da resistência. Antigamente as leis e a própria sociedade protegiam a população desta proliferação de "libertação sexual".
As massas, no dia de hoje, servem de pornografia legalizada em doses que outras gerações achariam incríveis. Torna-se tão natural que parece que voltamos à selva para curtir a nudez! O que é que o cristão deve fazer? Jó disse: Fiz aliança com meus olhos, como, pois, os fixaria eu numa donzela?" (31.1).
Nossa autoconfiança por si mesmo pode nos largar na hora da tentação se não tomarmos as necessárias providências. Não imaginemos que a Davi faltou um bom caráter; mas caiu no adultério numa hora em que descansava confortavelmente no palácio.
Diferentemente de Urias, seu coração retirou-se do campo da batalha física para se entregar ao inimigo dentro de si (2 Sm 11.1-11).
O pecado sexual não nos derruba repentinamente, mas surge de uma atitude relaxada em relação aos apetites e sensualidade. O caráter falha se não tiver princípios firmemente fundados na Rocha. Rigorosa disciplina é pouco diante da força da tentação.
O Pastor David Wong, do Instituto de Liderança Avançada, no Havaí, sugere três princípios para manter discrição sexual:
- Estabeleça uma linha demarcada para controlar seu relacionamento com mulheres e homens;
- Cultive um forte relacionamento de amor com sua própria esposa ou marido; e
- Redima o tempo: não permita que imaginação e fantasia quebrem sua comunhão com Deus.
Jonathan Edwards viveu em harmonia consigo mesmo seguindo várias resoluções. Uma delas vale a pena adotar: "Resolvi, a partir deste momento, e até a minha morte, jamais agir como se a minha vida me pertencesse, mas como sendo total e inteiramente de Deus."
3. Integridade na Área de Finanças
O caráter do cristão se revela na maneira que maneja o dinheiro. Paulo tinha grande receio que a condução das ofertas levantadas nas igrejas de Macedônia e Acaia, para os irmãos pobres da Judéia, trouxesse motivos para questionar sua integridade.
Insistiu que as Igrejas mandassem com ele cinco irmãos para evitar que qualquer possibilidade de acusação ganhasse credibilidade.
Não foi apenas Judas que se aproveitava da tesouraria dos discípulos para satisfazer a sua avareza. Pregadores munidos de escassos escrúpulos apareceram em Corinto para tirar vantagens financeiras "mercadejando a Palavra" (2 Co 2.17).
Paulo se esforçava para sempre ter uma "consciência pura diante de Deus e dos homens" (At 24.16). Hoje o descaso na área de finanças não combina bem com o alto padrão de caráter cristão, segundo a Bíblia.
A avareza é condenada como pecado mortal (1Co 6.10):
"Amor ao dinheiro é a raiz de todos os males e alguns, nessa cobiça, se desviaram da fé e a si mesmos se atormentaram com muitas dores" (1Tm 6.10). Paulo foi inspirado por Deus para nos mostrar o perigo que corremos quando permitimos que esse amor idólatra encontre guarida em nosso coração.
Nossa sociedade consumista encoraja contratação de dívidas que a Palavra de Deus proíbe (Rm 13.8 ). A marca do caráter cristão é o contentamento com o que Deus nos dá (1Tm 6.6). Foi parte da disciplina do amadurecimento do caráter de Paulo que o levou a dizer: "aprendi a viver contente em toda e qualquer situação" (Fp 4.11). Jesus falou uma verdade de grande valor para nossos dias: "Onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração" (Mt.6.21).
4. Auto-Defesa
Mais uma característica do caráter humano é tentar evitar a dor da culpa e não passar a vergonha de confessar publicamente um pecado escandaloso.
Quem já confrontou um irmão mergulhado nalgum pecado deve esperar, de antemão, uma reação de auto-defesa. Nada mais comum do que um pecador mentir num momento de aperto. Acha melhor esconder a transgressão do que confessá-la e alcançar perdão. E nos casos em que não há meio de escapar da veracidade da acusação, o culpado tenta se defender, minimizando a gravidade de suas ações.
Somente um caráter recriado pelo Espírito Santo tem coragem para confessar:
"Eu sou o culpado, e mais ninguém". Assim disse Davi:
"Pequei contra ti, contra ti somente pequei, e fiz o que é mal perante os teus olhos..." (Sl 51.4). Um caráter bem nutrido na Palavra e fortalecido pela comunhão com Deus, poderá escapar das cadeias de auto-defesa.
Os bem-aventurados de fato, são os pobres de espírito, os que se sentem grandemente beneficiados quando Deus os humilha e exalta o Salvador. Charles Simeon, pregador destacado de Cambridge durante 54 anos, na virada do século 17 achou que toda pregação deveria ter esta prioridade dupla.
Conclusão
Poderíamos debater durante horas sobre quais são os pecados que mais facilmente proliferam em nossa sociedade. Evidentemente, a cultura influencia atitudes de todos os que foram criados num único ambiente. Sendo, o bom caráter, um conjunto de qualidades apreciadas na cultura, pode-se esperar que a cultura formará atitudes e reações típicas.
Como o cristianismo bíblico faz parte da contra-cultura, devemos definir a melhor maneira de combater as tentações características. Hebreus nos alerta contra o
"pecado que tão tenazmente nos assedia" (Hb 12.1).
A formação do caráter, segundo o padrão bíblico, sólido e cheio de convicção na Verdade, deve fazer parte da formação de nossos filhos e ser um alvo prioritário de nossas igrejas.
O caráter se torna mais seguro, se tiver modelos excelentes no pais e nos líderes das igrejas. A glória de Deus brilha mais intensamente em vidas que mostram integridade e buscam a santidade.
Fonte: http://www.lideranca.org/cgi-bin/index.cgi?action=viewnews&id=115
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