March 31, 2017

Delicadeza é a virtude necessária para a percepção do amor no mundo

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- Luiz Felipe Pondé

Muitos duvidam da existência do amor. Muitos afirmam ser ele uma invenção da literatura. Outros, que se trata de uma projeção neurótica imaginária. Uma patologia da família das manias. Há quem suspeite de que seja uma doença da alma. Estão errados.

Quem conhece o amor sabe que ele habita entre nós. E sua presença nos faz sentir vivos. Por isso, o ressentimento é cego ao amor. Pode ser raro, randômico, frágil muitas vezes, mas nem por isso menos marcante quando percebido.

Este é o tema do filme sueco "Um Homem Chamado Ove", de Hannes Holm, que foi indicado para melhor filme estrangeiro no Oscar deste ano. O cinema escandinavo está sempre entre os melhores do mundo. 

Poucos lidam com temas do afeto de forma tão elegante, do desespero à beleza, mas sempre elegante.

A história é um clássico: a morte de uma esposa amada e a solidão decorrente. O filme narra a "cura" do homem chamado Ove, principalmente, pelas mãos de sua vizinha grávida iraniana, e suas filhas, além de todos os vizinhos em volta, lembrando, em muitas cenas, uma máxima rabínica: Deus está nos detalhes.

E o Messias entra pela fresta da porta. O amor também, como diz o livro bíblico "Cântico dos Cânticos". A falta de atenção para com os detalhes torna qualquer pessoa obcecada pela falta de sentido das coisas. A delicadeza é a virtude cognitiva necessária para a percepção do amor no mundo.

Só quem conhece o amor sabe o desespero que pode ser perder a quem se ama. O amor é incomum.

Claro, nada tem a ver necessariamente com o casamento. Pode, inclusive, morrer pelas mãos do casamento. Casa-se com quem se ama porque o amor pede o convívio. A presença viva de que ele existe.

Estar longe de quem se ama implica numa falta que beira a asfixia. Na verdade, o amor está entre as formas mais poderosas de significado na vida. E vai muito além do amor romântico propriamente dito.

A percepção repentina do amor pode dar a quem o vê a sensação de estar diante de um milagre, dado a sua leveza, humildade e generosidade.

A falta de amor na vida produz um certo ceticismo em relação ao mundo. Ou pior: o sentimento de inexistência. O mundo fica escuro, e você, vazio. A falta de amor beira a descrença. Perde-se a confiança nas coisas. Mesmo nas árvores e nos pássaros.

Um dos pecados maiores da inteligência é chegar à conclusão de que o amor é uma ficção. Mas não é a inteligência que aí fala, mas a tristeza de um coração em agonia.

Muitas vezes, pessoas supostamente inteligentes consideram o amor algo ingênuo e pueril. E quem ama, um equivocado.

Não há razões pra amar, uma vez que o mundo parece provar a cada minuto que ele é o terreno da raiva, do rancor e do ressentimento. A ciência do mundo parece mesmo ser um tratado sobre a desconfiança.

Søren Kierkegaard (1813-1855), em seu "As Obras do Amor", da editora Vozes, alerta aos inteligentes que não confundam o amor com alguma forma de ignorância da mentira e dos riscos.

A desconfiança se acha a mais completa das virtudes morais ou cognitivas. A armadilha de quem desconfia sempre é que ele mesmo se sente inexistente para o mundo porque este é sempre visto com desprezo. É da natureza do amor olhar para fora e não para dentro. O amor não é apaixonado por si mesmo.

Outra suposta arma contra o amor é o fato de a hipocrisia reinar no mundo. A hipótese de a hipocrisia ser a substância da moral pública parece inviabilizar o amor por conta de sua cegueira para com esta hipocrisia mesma.

É verdade: o amor não vê a hipocrisia. Kierkegaard diz que há um "abismo escancarado" entre eles. Este abismo é de natureza, isto é, a diferença de postura entre os dois torna o amor tão distante da hipocrisia, que sua pantomima, fruto do desprezo pelas coisas, é invisível aos olhos do amor que une as coisas.

O amor é concreto como o dia a dia. Engana-se quem o considera abstrato e fantasioso. Kierkegaard nos lembra em seu primeiro ensaio como o amor só se conhece pelos frutos. Isso implica que não há propriamente uma percepção do amor que não seja prática. 

O gosto do amor é a confiança nas coisas que ele dá a quem o experimenta. 

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/luizfelipeponde/2017/03/1869990-delicadeza-e-a-virtude-necessaria-para-a-percepcao-do-amor-no-mundo.shtml

March 30, 2017

Tolstói ou Dostoiévski?

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- Luiz Felipe Pondé

Existem dois tipos de alma: ou você está próximo de Dostoiévski (1821-1881) ou de Tolstói (1828-1910). Talvez pareça excessivamente chique uma divisão dessas, mas, ao fim dessa coluna, espero que fique menos obscuro esse critério.

Essa é a tese do crítico George Steiner em seu maravilhoso livro "Tolstói ou Dostoiésvki", da editora Perspectiva. Um dos livros mais belos que já li na vida. Próximo ao "Obras do Amor" de Kierkegaard (1813-1855), que é de longe o livro mais belo escrito em filosofia ou teologia que conheço.

A beleza e o amor suspendem a vida acima da banalidade do cotidiano. Despertá-los talvez seja a missão mais sublime que alguém pode ter na vida com relação aos seus semelhantes.

Uma das forças da literatura clássica é nos fazer conhecer a nós mesmos. Sei que está na moda dizer que não existe literatura clássica, mas deixemos de lado essa discussão entediante.

A tipologia que nos propõe Steiner deita raízes nos dois estilos gregos: o épico e o trágico. Tolstói estaria no primeiro, Dostoiévski no segundo. E, por consequência, são dois modos distintos de viver a vida. Ambos carregando a grandiosidade de espíritos avassaladores, como os dois escritores russos.

O épico seria o estilo em que a vida está envolvida pela presença do mito ou da religião, fundando uma ação fincada na esperança prática do transcendente (mundo dos deuses) e, por consequência, na esperança da redenção do mundo. Salvar o mundo é sua marca. Pessoas épicas sentiriam que suas vidas são acompanhadas por forças que as tornam capazes de redimir o mundo de suas misérias. Sua virtude central é a esperança.

Por "prática" aqui, quero dizer que se trata de um espírito religioso não meramente teórico ou alienado do mundo, mas profundamente enraizado nas agonias e demandas do mundo.

Para Steiner, Tolstói tem esse espírito de modo bem evidente, entre outros momentos, no período em que escreve "Ressurreição", que começou a ser publicado na Rússia em fascículos em 1899. O Conde Tolstói nessa época estava bastante envolvido na luta contra as injustiças da Rússia czarista, e abraçou, no final da vida, uma forma de anarquismo cristão pietista bastante radical.

O trágico seria o estilo em que o olhar para a vida se mantém fincado na fragilidade dela.

A precariedade é a estrutura dinâmica da vida. Nas palavras do escritor americano Henry James (1843-1916), uma vida tomada pela "imaginação do desastre". Aqui não há redenção, há coragem de enfrentar esse "desastre" que é a existência humana. Para Steiner, esse é a alma dostoievskiana. Sua virtude central é a coragem.

Aqui, mesmo que haja o divino, como há em Dostoiévski, o peso do drama cai sobre as costas do homem que caminha sozinho pelo chão do mundo. A beleza de Deus, na forma de "taborização" de seus místicos, como se fala na teologia russa, em referência à transfiguração do Cristo no Monte Tabor, aparece sempre como iluminação da agonia humana a sua volta (basta ver o Príncipe Mishkin do romance "O Idiota").

O místico em Dostoiévski ilumina por contraste. Sua luz divina faz a doçura do perdão brotar na consciência atormentada do pecador.

Uma alma tolstoiana é uma alma iluminada pela esperança e pela vitalidade que Deus lhe empresta. Seu elemento é a força de atuar no mundo social e político.

Uma alma dostoievskiana é iluminada pela dor e pela coragem que a mantém de pé. Seu elemento é a misericórdia como substância de sua psicologia espiritual.

E como passamos dessa alta teologia para o chão do cotidiano de nós mortais?

Almas tolstoianas lutam a cada dia contra a miséria do mundo, fazendo deste um campo de batalha contra o mal, movidas por uma certeza que parece alucinada.


Almas dostoievskianas, um tanto mais delicadas, suportam o sofrimento encantando o mundo a sua volta com piedade e sinceridade avassaladoras.

Felizes são aqueles que convivem com pessoas assim. A vida se transfigura em esperança e coragem. Duas faces da graça que sustenta o caminho dos homens. Mas, sem humildade, como sempre, seremos cegos a essas virtudes de Deus.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/luizfelipeponde/2017/03/1867950-as-almas-se-dividem-entre-as-proximas-de-tolstoi-ou-de-dostoievski.shtml

March 29, 2017

Antes de seguir em frente

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- Cicero Alvernaz

Antes de seguir em frente
dê uma parada e leia os avisos:
estrada sinuosa, declive, aclive,
e curvas em forma de S.

Antes de seguir em frente
olhe pelo retrovisor,
se ajeite no banco,
coloque o cinto de segurança,
tenha cuidado com a criança,
mais cuidado ainda com o idoso
e mais cuidado ainda com os animais.

Antes de seguir em frente
respire fundo, conte até três,
olhe o relógio, consulte as horas,
afinal, a estrada é longa.

A vida é assim:
exige muito cuidado,
a vida é uma criança pequena,
é um sonho, um momento apenas,
um olhar pela janela,
um tempo que se esfarela,
um sorriso sem graça,
tarde de sol numa praça,
um verso que não quer sair.

A vida pode ser um suspiro,
um fato no qual eu me inspiro,
um animal a fugir...
Antes de seguir em frente
seja firme, consciente,
deixa Deus te dirigir.

Fonte: http://www.ultimato.com.br/comunidade-conteudo/antes-de-seguir-em-frente

March 28, 2017

A urgência de viver uma vida de verdade

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- João Pereira Coutinho

O terrorismo visitou Londres - mais uma vez. Nos dias seguintes, os sobreviventes falaram. Um deles correu mundo em fotografia que se tornou icônica: vemos um rapaz de vinte e tantos anos, com barba, sentado numa cadeira de rodas, embrulhado num cobertor.

O nome é Francisco Lopes, 26, português. E, desnecessário será dizer, a mídia lusa assaltou o patrício para entrevistas e testemunhos. Não sei o que esperavam escutar. Francisco, que vive e trabalha em Londres, limitou-se a banalidades. Mas como são belas as banalidades!

Para começar, tudo lhe pareceu rápido, assustadoramente rápido: ele já estava no fim da ponte de Westminster, junto ao Big Ben, quando sentiu o bafo do carro sobre o ombro. Atingido pelo terrorista, verificou que estava vivo. Ferido, mas vivo.

Levado para o hospital, seguiram-se os curativos e, depois dos curativos, as primeiras impressões. "Sinto que tenho uma segunda vida", disse ele aos jornalistas. E agora? O que fazer com essa "segunda vida"?
O jovem, na sua simplicidade, confessou: quer ir a Portugal, visitar a avó que não vê há anos. E, no futuro, não devotar toda a existência ao trabalho.

Sim, o tempo tudo cura. Até a lucidez. Daqui a semanas ou meses, é provável que o Francisco, novamente com o corpo funcional, já esteja de volta à velha roda de hamster onde todos pedalamos em direção a lado nenhum.

Ou talvez não. Eis uma boa pauta para os jornalistas: saber o que foi feito daquela "segunda vida". Porque nem todos têm a graça de receber uma.

Que o diga Bronnie Ware. Quem? Explico: Bronnie Ware é enfermeira na Austrália, especialista em cuidados paliativos para doentes em fase terminal. E, anos atrás, em pequeno livro da sua autoria ("The Top Five Regrets of the Dying"), a enfermeira resolveu partilhar com os vivos quais os 5 maiores arrependimentos daqueles que viu morrer.

Instintivamente, pensamos em gostos extravagantes: viagens que não se fizeram; casas onde não se viveram; dinheiro que não se ganhou. E, para os cínicos, todos os patrões aos quais não se removeu o escalpe.
Para surpresa da enfermeira, os arrependimentos eram outros. Banais, como as palavras do Francisco. E recorrentes. Como se a proximidade da morte, "dissolvendo o ego" (bela expressão da autora), dotasse o ser humano de uma clareza essencial.

Essa clareza começava pelo reconhecimento de que raros são aqueles que têm a coragem de viver a vida que desejam. A maioria lamentava ter vivido a vida que os outros esperaram que eles vivessem. Os moribundos não se perdoavam a si próprios: pela covardia, pela acomodação ou, pior ainda, pelo adiamento constante daquele dia libertador em que a "verdadeira vida" começaria.

O trabalho em excesso vinha em segundo lugar. Entre os doentes, havia uma difusa sensação de traição: como explicar o infortúnio para quem sempre investira tanto nas virtudes da responsabilidade, do esforço e da excelência? No fundo, para quem sacrificara tanto? Onde estava a justiça do "acordo"?

Depois das relações com o eu, surgiam inevitavelmente as relações com os outros. A incapacidade de expressar os sentimentos exatos - as palavras que não foram ditas, ou mal ditas - e os amigos que se perderam por estupidez ou negligência.

A concluir a lista, o arrependimento óbvio, uma espécie de súmula dos arrependimentos anteriores: não terem sido "felizes", ou mais felizes, por uma questão de (má) conduta e (má) atitude.

Todos os dias, acordamos e agimos como o jovem português em Londres. Prontos para representar o papel que nos foi concedido. Obcecados com a "carreira" e as suas perecíveis glórias. Pateticamente iludidos de que haverá sempre tempo para os outros. E jamais pensamos que haverá uma ponte; uma rua; uma doença; um golpe de azar que não estava na agenda.

Mas há afortunados que sobrevivem. Ou, pelo menos, que sobrevivem o tempo suficiente para se verem no espelho pela primeira e última vez.

Diz a sabedoria popular que é importante aprender com os próprios erros. Talvez. Pessoalmente, prefiro o célebre adágio de que é mais inteligente aprender com os erros dos outros. Porque a questão é simples e arrepiante: estaremos a viver a nossa vida como se fosse uma segunda vida?

Um abraço ao meu compatriota Francisco. E, se me é permitido o abuso, cumprimentos para a senhora sua avó.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/joaopereiracoutinho/2017/03/1870300-estaremos-a-viver-a-nossa-vida-como-se-fosse-uma-segunda-vida.shtml

March 27, 2017

Saber morrer é o melhor remédio para poder crescer

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- Billy Lacy Lane

Anos atrás, li o livro “Comunidade: lugar do perdão e festa” que me marcou muito e até hoje procuro reler e relembrar alguns de seus pontos principais. O livro é escrito pelo filósofo e teólogo francês, Jean Vanier, fundador da comunidade L’Arche, que se tornou uma federação de 149 comunidades espalhada por 37 países. A comunidade foi criada para oferecer a pessoas com deficiência mental uma vida em comunidade com seus cuidadores e voluntários.

No livro, Vanier fala de como nossa vida em comunidade implica muitas vezes perder as ilusões e que essa perda é o caminho para o crescimento. Por isso diz que “crescer é aprender a morrer” (p.194). A cada nova fase da vida, temos de deixar certas coisas ou modos para trás e prosseguir adiante. Isso significa lidar com perdas, o que pode ser muito doloroso.

Inspirado na relação de Pedro com Jesus, Vanier sugere que assim como Pedro passamos como comunidade por quatro crises. A primeira é a do chamado ou entrada na comunidade. Deixamos velhos relacionamentos e modo de viver para trás. Talvez ainda preservemos laços com os lugares e valores que deixamos. A segunda é quando descobrimos que a comunidade não é tudo aquilo que achávamos que era ou que devia ser. É a decepção causada pelo choque entre a ilusão ou ideal que tínhamos com a realidade. Corresponde ao momento em que Pedro descobre que Jesus não seria o messias que ele desejava ou imaginava. A terceira crise envolve rejeição e incompreensão. Quando percebemos que a comunidade não nos entende, que não seremos escolhidos para essa ou aquela função e talvez nem reeleitos para o cargo que ocupamos. A quarta crise, a mais dolorosa, é a que gera revolta, talvez ciúme. Quando nos vemos decepcionados, quem sabe traídos, e, sobretudo tomados de um sentimento de incapacidade, inadequação, incompetência para continuar fazendo o que estamos fazendo. Essa crise muitas vezes nos leva ao abandono, desistência e isolamento.

Essas crises representam um choque entre nossas ilusões e ideais, de um lado, e a realidade, do outro. Cada uma delas faz morrer em nós desejos, ideais, visões, paixões e imagens que criamos de nós mesmos, das pessoas e da comunidade.

Mas a ideia de fazer morrer para poder crescer nos faz lembrar pelo menos duas figuras bíblicas, ambas extraídas da própria natureza. A primeira é a da aliança de Deus com Noé e seus descendentes em Gênesis 9. Depois da corrupção da humanidade, do dilúvio e do resgate da família de Noé, Deus renova a bênção dada a Adão de torná-lo fecundo, multiplicá-lo e espalhá-lo pela terra. Porém, ao contrário da aliança com Adão, a de Noé incluía a morte. A partir de então a morte faz parte da manutenção da vida. Enquanto a Adão foi dada toda sorte de vegetais para alimento (Gn 1.31), a Noé Deus dá também a carne animal (Gn 9.). Por isso, a morte sustenta a vida. A morte do animal dá vida ao ser humano. Eu chamo isso de paradoxo da vida. Para o ser humano viver é preciso haver morte. Penso que isso não só delimita a vida física, mas também estabelece um princípio ou axioma do sacrifício. O acesso à vida e comunhão com Deus se dá por meio da morte, primeiro do animal como sacrifício, depois de outro ser humano, Jesus Cristo. A morte sustenta a vida. A vida se mantém pela morte.

Outra figura bíblica é a do grão de trigo que precisa morrer para produzir fruto (Jo 12.24). Ao aproximar o tempo de sua crucificação, Jesus diz aos discípulos que era preciso que ele morresse para que fosse glorificado. A sua morte abriu o caminho para a vida por meio da ressurreição. Era preciso que ele morresse para ter vida e nos dar vida. Mas com isso Jesus também aponta para um modo de vida. Todo aquele que desejar preservar sua vida irá perdê-la, mas quem a perder (ou odiá-la) a preservará para sempre (Jo 12.25). O chamado para seguir a Jesus é o chamado para morrer a fim de viver.

Vejo que esse princípio de morrer para viver ou crescer se aplica a inúmeras situações de nossa vida. Pastores que, depois de alguns anos em suas comunidades, se veem decepcionados com a comunidade ou consigo mesmos; membros de igreja decepcionados com a comunidade ou com sua liderança; missionários em choque cultural e sentimento de incapacidade ou inadequação para aquele ministério; profissionais que se questionam se fizeram as escolhas corretas na vida; casais na fase de desilusão e decepção com o relacionamento; adultos em meia-idade ressentidos e sem perspectiva. Cada uma dessas situações podem nos levar ao abandono e isolamento. Mas viver e crescer é saber morrer. Então, é preciso fazer morrer algumas coisas para encontrarmos novamente vida.


Fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/saber-morrer-e-o-melhor-remedio-para-crescer 

March 26, 2017

Cansaço e esgotamento: para descansar é preciso crer

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- Reinaldo Percinotto Júnior
Texto básico: Marcos 6. 7-13, 30-44
Textos de apoio– Gênesis 2. 1-3
– Êxodo 20. 8-11
– Salmo 62. 1-8
– Mateus 12. 1-14
– Hebreus 4. 9-11
– Apocalipse 14. 13

Introdução

O cansaço, e eventualmente até mesmo o esgotamento (“burnout”), tem se tornado uma experiência cada vez mais comum na nossa sociedade, inclusive entre os cristãos.
No que diz respeito ao ambiente cristão, uma das consequências mais desastrosas do cansaço é o surgimento de um coração endurecido e insensível, que nos afasta da compaixão pelo próximo e também da possibilidade de sermos renovados pelo Senhor.
No presente estudo vamos olhar para um momento de cansaço e estresse dos apóstolos de Jesus, diante das suas demandas ministeriais, e buscar analisar como o Mestre procurou ajudá-los a lidar com as consequências do cansaço, levando-os a um espaço de descanso e de confiança na Sua graça e provisão.
Temos nos preocupado com nosso cansaço, buscando previamente alternativas para minorar suas consequências? Ou normalmente agimos apenas como “apagadores de incêndios”? O descanso sabático, em um dia completo da semana ou em algum horário curto de cada dia, tem sido uma disciplina saudável dentro de nossa prática espiritual? Temos visto esta prática não apenas como uma necessidade, mas como uma oportunidade de relacionamento confiante com o Senhor de nossas vidas?

Para entender o que a Bíblia fala

  1. Você acha que a missão executada pelos doze tenha sido desgastante (vv. 12-13)? Que palavras ou expressões ajudam a justificar sua resposta?
  1. Após a intensa atividade realizada nos povoados, os discípulos retornam para junto de Jesus (v. 30), relatando tudo o que tinha acontecido. Talvez esperassem ter um merecido tempo de descanso, mas isso não foi possível. Por que? Qual a solução encontrada por Jesus (v. 31)?
  1. Até que enfim iriam descansar… Mas, novamente tiveram seus planos frustrados por uma multidão de necessitados (vv. 32-33). O plano inicial era o descanso, mas por que Jesus resolveu atender a multidão (v. 34)? Como você acha que os apóstolos devem ter se sentido com esta decisão de Jesus?
  1. Será que Jesus considerava o descanso pouco importante ou secundário (v.31)? A experiência da multiplicação dos pães e peixes, de alguma maneira, pode ter proporcionado um momento de descanso para os discípulos? Como?
  1. Uma vez que o descanso e a compaixão são marcas inegociáveis do discipulado cristão, como as atitudes de Jesus neste trecho (vv. 31, 34) nos ensinam sobre a complementaridade de ambos, sem deixar que sejam necessária e mutuamente excludentes?

Hora de Avançar

“Uma dificuldade que todos os que procuram servir a Deus enfrentam é não saber celebrar, contemplar a grandeza, a majestade e o governo de Jesus Cristo. O repouso sabático é um mandamento da graça de Deus. É o lugar onde aprendemos que é Deus, e não nós, quem governa e reina. É o lugar onde somos nutridos e restaurados por ele, onde a aliança é reafirmada e aprendemos a celebrar o cuidado e a bondade de Deus. Disse Jesus: “Vinde repousar um pouco, à parte, num lugar deserto”. É apenas disso que precisamos”.  (Ricardo Barbosa) 

Para pensar

A prática do descanso em um dia da semana, ou de uma hora por dia, ou idealmente a prática de ambas as estratégias, podem nos proporcionar uma melhor percepção e uma preparação especial para remirmos todo o nosso tempo. O “dia sabático” nos permite compreender o verdadeiro sentido dos outros seis dias de semana. O rabino Abraham Heschel no lembra: “O descanso sabático serve de exemplo do mundo futuro… A essência do mundo por vir é um descanso sabático eterno, e o sétimo dia, dentro do tempo, é um exemploda eternidade”.
Ainda segundo Heschel: “A grosso modo pensamos que a terra é a nossa mãe, que o tempo é dinheiro e que o lucro é nosso companheiro. Mas o sétimo dia serve-nos de lembrete de que Deus é o nosso Pai, de que tempo é vida e de que o espírito é o nosso companheiro”.                        

O que disseram

Em um sentido mais profundo, não guardamos o sábado; o sábado é que nos guarda. A finalidade do sábado era ser o período de lazer intencional em que refletíssemos sobre a origem e os alvos de nossa vida na terra. Logo, o sábado nos mantém voltados para Deus, como quem está viajando com destino ao céu. E assim, mostramo-nos disponíveis ao dom do sábado precisamente porque não somos capazes, por nós mesmos, de suster nossa jornada em direção a Deus, em direção ao céu. (Paul Stevens,Disciplinas Para Um Coração Faminto, Abba Press, 1994)   

Para responder

  1. Você está se sentindo pressionado ou desgastado em sua vida pessoal ou ministerial? Que decisões práticas você poderia tomar para evitar que esta situação atinja um estágio de “esgotamento espiritual”?
  1. Alguma vez você percebeu que o cansaço havia “sabotado” sua compaixão e a sua vontade de cuidar do próximo? O que você aprendeu desta experiência?

Eu e Deus 

Aquele que habita no abrigo do AltíssimoE descansa à sombra do Todo-poderosoPode dizer ao Senhor:“Tu és o meu refúgio e a minha fortaleza,O meu Deus, em quem confio”.
( Salmo 91. 1-2, NVI )   
Fonte: http://ultimato.com.br/sites/estudos-biblicos/assunto/vida-crista/cansaco-e-esgotamento-para-descansar-e-preciso-crer/

March 25, 2017

Silêncio para ouvir, descanso para sentir

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- Gladir Cabral

Depois de um ano inteiro de correria, de trabalhos acumulados e estendidos, de rotina exaustiva de tantas buscas, metas a serem alcançadas, produção e mais produção, trabalho e mais trabalho, eis que chegamos ao tempo das férias de verão. Nosso corpo cansado e nossa cabeça atucanada já se haviam desacostumado a descansar. Sentimos que falta algo. Incomodam-nos o ócio, o tédio e a improdutividade. Diria até que uma pitada de culpa vem empanar o brilho destas tão merecidas férias.


No entanto, é preciso lembrar que o descanso entra nas Escrituras primeiramente como parte do movimento criativo de Deus que, após criar o mundo e tudo o que nele há, em seis dias, escolheu o sétimo para descansar, dando-nos um grande exemplo. Como bem lembra Jacques Ellul, a história humana começa quando Deus resolve descansar. E não por acaso, as Escrituras colocam o descanso como mandamento para nossas vidas. Está nas tábuas divinas concedidas a Moisés: “Lembra-te do dia de sábado...”. 

Não precisamos de pressa nem de morosidade. Vivamos com atenção o presente, pois afinal “esse é o tempo que importa” (Leon Tolstoy). Aprendamos com a natureza. Os ursos hibernam a cada inverno, assim como vários tipos de árvores, que deixam amarelar e cair suas folhas, à espera do ressurgimento da vida na próxima primavera. Não apenas nosso dia é intercalado com períodos preciosos de descanso (o sono), mas também nossa semana de trabalho é intermeada por dias de repouso e devoção (Sabath). Num ciclo mais longo, precisamos ao fim de um ano de lutas, encontrar lugar e tempo para descanso. 

Thomas Merton disse certa vez: “Se não temos nenhum descanso, Deus não abençoa nosso trabalho”, tão importante é o descanso para nossa vida. E assim, aproveitamos o período de repouso para renovar nossa vida espiritual e refletir sobre a caminhada até aqui e os próximos passos a serem trilhados. O descanso é oportunidade para exercício da contemplação, da oração, da meditação. Como sugere filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard, o tempo livre contribui para nosso alimento espiritual. Ou como me disse certa vez um amigo meu, mecânico de caminhão, “no domingo a gente sente a vida”.

O descanso é também uma oportunidade para escapar do poder encantatório do tempo planificado, regulado pela modernidade e pelo mercado. Esse é um grande desafio, já que até mesmo o tempo de lazer está comprometido pela lógica do consumo e do controle. Há, portanto, um quê de resistência no ato de descansar. Configura-se num gesto político autêntico, que rejeita até mesmo a sedução do mercado turístico e da indústria do lazer. O filósofo protestante Jacques Ellul denuncia o caráter idolátrico, religioso do mercado e suas prerrogativas absolutas. 

O descanso torna-se mais significativo ainda quando acompanhado de silêncio e arte. No silêncio, na pausa, podemos contemplar a beleza da criação e saborear o mistério da vida. É preciso parar para pensar. É preciso parar para sentir. É preciso parar para digerir o que se passa. Sem silêncio não há palavra, nem poema, nem música. Sem pausa não há movimento nem direção. Como diria Josef Pieper, “o tempo livre é uma condição da alma”.

Em seu livro sobre a arte do silêncio, Pico Iyer escreve que “só os que estão em silêncio podem ouvir”. Parece óbvio, mas no dia a dia acabamos nos esquecendo desse princípio e perdendo pouco a pouco a capacidade de silenciar e, portanto, de ouvir. A própria leitura se enriquece com o descanso, como recomenda Thomas Merton: “Penso que preciso desta colina, deste silêncio, desta geada, para realmente entender este grande poema, viver nele”. 

O descanso é providencial também para fertilizar nossa criatividade e inspirar nossa imaginação. É nesse contexto de relaxamento que a arte se torna possível. Nascem canções, quadros, poemas, livros. E ouvimos Mário Quintana ao dizer: “O que prejudica a minha preguiça prejudica o meu trabalho”, pois não há como ser criativo sem certa medida de ócio santo.

Talvez a melhor definição de descanso seja esta de Thomas Merton: “Para esta tarde tornar-se minha própria eternidade, ela deve ser minha própria tarde, e eu devo possuir a mim mesmo nela, não ser possuído por livros, por ideias que não são minhas, por uma compulsão para produzir o que ninguém necessita. Mas simplesmente glorificar a Deus ao aceitar seu dom e seu trabalho. Servi-lo é trabalhar de modo que eu mesmo possa viver”.

Fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/descanso-para-sentir-silencio-para-ouvir

March 24, 2017

O que artistas e comunidades podem fazer?

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Como lidar com o lado obscuro da criatividade e a nossa fome por beleza

- Karen Bomilcar

Há muito se pesquisa sobre a relação entre a criatividade e saúde mental. São diversas as especulações, mas estudos recentes indicam correlação entre o aspecto da criatividade e índices de transtornos mentais, como quadros depressivos e maníacos. 

Freud já havia sugerido questões semelhantes. 

Na década de 1970, psiquiatras norte-americanos iniciaram estudos aprofundados em neurociência e comportamento, acerca do tema. Buscavam uma maior compreensão entre a genialidade e as alterações psicológicas. Sabe-se atualmente, por exemplo, que os neurotransmissores ligados à criatividade são os mesmos que estão conectados a alguns sintomas psicóticos.

Fome de beleza e bloqueio criativo

O estigma que cerca os transtornos mentais dificulta nosso diálogo e reflexão sobre os mesmos. E na vida do artista, a arte e a criatividade podem tanto mascarar sintomas como potencializá-los, uma montanha russa emocional para o artista, ofuscado e nutrido pelo deslumbramento para aquele que aprecia sua arte. Esta realidade dificulta que as questões de saúde mental sejam identificadas, devidamente cuidadas e acompanhadas.

Como seres humanos, fomos presenteados com habilidades para imaginar, criar e concretizar. Esta imaginação pode nos mobilizar e desafiar na busca de algo maior, concretizar projetos traduzindo os valores e a beleza de quem fomos criados para ser. 

Como cristãos, entendemos que fomos criados à imagem e semelhança de Deus, o doador da vida, da imaginação, da criatividade, da sensibilidade. 

Temos fome de beleza. 

O autor Erwin McManus nos relembra em seu livro “A alma do artista”, como fomos criados à imagem e semelhança de Deus, temos valor, sentido e significado, somos obra de arte do Criador. Temos potencial criativo para imaginar e criar, tornando “visível aquilo que está invisível”, através de nossa arte.

O artista então se depara com este desafio e privilégio em qualquer área de manifestação artística: na música, literatura, teatro, artes plásticas, etc. 

A arte é uma forma de manifestar e traduzir sentimentos e emoções, o que faz com que o artista se debruce sobre seus próprios sentimentos, investigando-os e desenvolvendo-os e oferecendo o que deseja transmitir, direta ou indiretamente. 

Este mergulho profundo na alma pode se transformar em potencial criativo e criador, bem como apresentar um quadro de desorganização – uma vez que o pensamento se desenvolve de forma livre nas mais diversas direções, em alguns casos, gerando um excesso de informações ou bloqueio criativo.

A personalidade do artista

O artista possui uma personalidade que contém uma sensibilidade aflorada, o que nos identifica e deslumbra, porém também se torna um desafio. Algumas características tão humanas se potencializam naquele que investe em sua arte. 

E é necessário que haja cuidado ao administrar seus desejos, tolerar a frustração em contextos em que as oportunidades não se apresentam, lidar com a rejeição, separar espaço para a criação, cultivar seus relacionamentos. 

O autor Scott Koffmann cita algumas características de pessoas com alto potencial criativo: sensibilidade, engajamento em jogos de imaginação, paixão, determinação, necessidade de solitude para criar, intuição aflorada, necessidade de estar aberto para novas experiências, habilidade para transformar adversidade em benefício, para citar algumas. 

Artistas são tradutores de sentimentos e necessitam de tempo, espaço e um ambiente que os acolha e nutra em tal processo criativo. É necessário que equilibrem seu tempo de solitude criativa com movimentos de criatividade coletiva bem como projetos comunitários. 

A construção de relacionamentos que potencializem suas ideias, bem como lhes dê parâmetros e referências da existência do outro. O artista necessita de equilíbrio quanto às questões do ego e da imagem, grande capacidade de empatia e isso é aprendido e desenvolvido na relação com o outro.

Identidade e expectativas

Como todo aquele que deseja oferecer ao outro algo único e diferente, o artista enfrenta dificuldades ao lidar com as altas expectativas, suas e dos outros. A questão da identidade é um ponto central para o ser humano e no que diz respeito aos artistas, uma questão que desafia em todo o momento. O desejo de que sua arte seja apreciada traz em si potencial mobilizador de crescimento, bem como dificuldades de autoestima, aceitação e necessidade de pertencimento. Esta dependência do olhar do outro visando aceitação e aprovação, pode tornar-se uma armadilha, gerando frustração e alimentando a autorreferência ao invés de relações de colaboração.

O artista sofre demasiadamente quando encontra censura, exclusão e rejeição. O ser humano tem a tendência de criar rótulos e no caso do artista, estigmas de descompromisso ou um olhar de idolatria ao serem considerados gênios. É essencial lembrarmos de que nosso sucesso não depende de nossos fracassos ou aprovações e sim de nosso caráter e identidade como filhos amados de Deus

O papel da comunidade

Assim, como todo ser humano, o artista necessita da comunidade para canalizar este talento para a construção e crescimento, oferecendo seu potencial criativo para o bem comum e desenvolvendo suas questões relacionadas à identidade no contexto da comunidade. 

Ao isolar o artista do contexto comunitário, contribuímos com o desrespeito e a desvalorização.

Tantos já enfrentam dificuldades em viver a partir de sua arte em contextos profissionais. Quando a comunidade os isola, o quadro se agrava. Os quadros depressivos em artistas estão intimamente ligados ao isolamento, sentimentos de insegurança e inferioridade, bem como na sensação da dificuldade de traduzir sua mensagem àqueles a qual a mensagem se destina.

O ego e os relacionamentos

Não é apenas papel da comunidade incluí-los, também é necessário o cultivo de um olhar de autocuidado por parte do artista. Enxergar-se primeiramente com um ser humano que, como todos os demais, necessita da construção de relacionamentos saudáveis, do cuidado com o corpo de forma integral, da identificação de uma cosmovisão que promova um parâmetro para o desenvolvimento de sua arte. O amparo social é fundamental na vida do artista. Em ambientes nos quais a competitividade e o culto ao ego estão em evidência, estar cercado de sinceros e bons amigos é essencial. 

Quanto às questões de saúde mental, o mesmo princípio se aplica a quadros maníacos, em que a criatividade pode estar associada com comportamentos autodestrutivos de toda ordem. Ao esgotar-se o processo criativo, o artista enfrenta um vazio que, para muitos, torna-se intolerável. Quantas histórias já ouvimos acerca de artistas que sucumbiram ao vazio, à falta de reconhecimento por parte do outro e a solidão. Esta realidade associada, por exemplo, a substâncias psicoativas, é uma receita fatal. 

Criatividade e saúde mental

É importante observar que os transtornos mentais, tanto nos artistas quanto em qualquer pessoa, são quadros multifatoriais que não devem ser observados de maneira isolada ou reducionista. 

Assim como estudos tem observado características relacionadas à criatividade e adoecimento, outras tantas abordagens tem relacionado a arte e seu inegável e imprescindível valor como recurso para a saúde, devolvendo beleza e significado para a vida de tantos que se deparam com desafios de saúde mental. 

Que sejamos sensíveis para acolher as fragilidades e talentos daqueles que nos oferecem arte. Que nosso olhar esteja voltado também para a pessoa por trás da arte, cuidados e relacionamentos. Que nossa história e caminhada compartilhada gere frutos de beleza, para que possamos celebrar o Belo, presentado a nós pelo Criador, doador de nossa criatividade. 

Para que possamos, apesar de nossas limitações e imperfeições, “tornar visível o que está invisível”, com encantamento e verdade. 

Fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/criatividade-e-saude-mental-o-que-artistas-e-comunidades-podem-fazer

March 23, 2017

A cada dia, a cada manhã

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- Carlos Martins

Não é fácil sair da cama. O medo e a angustia chegam como uma ave de rapina sobre a presa. Esses sentimentos têm se tornado mais e mais comuns e intensos a muitos de nós. A vida moderna com as suas múltiplas pressões, inclusive malignas, tem gerado angustias e perguntas cada vez mais aflitivas. Será que conseguiremos criar os filhos? Teremos forças e condições de protegê-los? Manteremos o nosso casamento? E o nosso emprego, por quanto tempo o teremos? E a saúde, a teremos até quando?

A descrição do homem no Éden foi de um "forte" Adão, criado perfeito, mas que logo sentiu medo, se escondeu, e fugiu de uma situação nova provocada por ele mesmo. O início do sentimento de pânico começou ali e até hoje traz tormento.


Há uma boa notícia: Não precisamos viver nesse temor e ou entrar em pânico. Há uma solução divina que podemos tomar como antídoto para esses momentos.


O profeta e escritor Jeremias que viveu um profundo sofrimento, ao ver familiares e amigos mortos e a sua cidade destruída, só encontrou descanso de alma e consolo para os olhos, quando enxergou em Deus a sua renovação diária. O amor e a fidelidade divina são para hoje e muito maiores do que todos os sofrimentos e medos que possamos antecipar com a nossa mente e vir a passar.


Outro autor bíblico disse: "O Senhor a cada manhã ministra a sua justiça e a cada novo dia Ele não falha".


O grande compositor e cantor de Israel expressou assim: "Louvado seja o Senhor que dia a dia leva o nosso fardo". Ele havia feito algo muito errado contra Deus e a uma família de amigos, mas no perdão do Senhor aprendeu que "a ira divina dura um instante, mas o seu amor dura a vida toda; o choro pode persistir uma noite, mas de manhã chega a alegria. Ao me sentir seguro com Ele, agora jamais serei abalado". Em outro momento quando se sentiu temerosos, ele lembrou: " Certamente que a bondade e a fidelidade do meu pastor, que é o Senhor, seguirão a cada dia comigo".


O que queremos pensar sobre essa nova manhã? Como viveremos esse novo dia?


• Apesar de nós, a graça de Deus se renova para hoje, por isso viveremos bem.
• Apesar de nós, Ele é fiel e pode cumprir as suas promessas, mesmo quando não conseguimos descansar na sua justiça.
• Apesar de nós, Ele não deixará que sejamos consumidos pelas pressões. Hoje podemos vencer com a força dele.
• Apesar das angustias e trevas, Ele trará luz aos nossos caminhos, pois Ele é a própria luz que andará conosco nesse dia.
• Apesar do caos no qual podemos me encontrar, Ele é poderoso para transformar as situações. Nada é grande demais para Ele. Ele é superior a tudo.


Graças ao Senhor, pois com a confiança no Deus da esperança já podemos sair da cama e vivermos o nosso dia sem angustias e medos dominadores.


Viva o Senhor! Vivamos bem esse dia que Ele fez para todos nós.


Fonte: http://www.ultimato.com.br/comunidade-conteudo/cada-dia-cada-manha-o-seu-amor-e-renovavel

March 22, 2017

Missão e esperança

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- René Padilla

Ninguém pode viver sem esperança. A pessoa que perde toda a esperança é como uma flor que murcha e morre. Porém, o que é esperança? Não é um mero desejo, mas sim um desejo que tem uma base suficientemente sólida para se projetar em direção ao futuro. No caso da esperança cristã, a base é a confiança na fidelidade de Deus no cumprimento de suas promessas.

Em Romanos 8.18-27 o apóstolo Paulo mostra que a esperança cristã abarca, em primeiro lugar, “a libertação de toda a criação” (v. 18-22). De alguma maneira, por causa do pecado humano, a criação “ficou sujeita à vaidade” (v. 20), ou seja, perdeu sua razão de ser. As palavras que Deus dirige ao homem depois da queda apontam para isso: “maldita é a terra por causa de ti”, e tal maldição é simbolizada pelos “espinhos e cardos” que a terra produz e que dificultam o cultivo (Gn 3.18). No entanto, a criação está incluída na esperança de redenção. Consequentemente, por um lado, “a ardente expectação da criatura espera a manifestação dos filhos de Deus”, ou seja, a manifestação da glória de Jesus Cristo nos filhos de Deus (Rm 8.19). Por outro lado, espera ser liberada, ela própria, da escravidão à destruição a que está sujeita por causa do pecado (v. 21). Deus tem o propósito de renovar a totalidade da criação e, portanto, “segundo a sua promessa, aguardamos novos céus e nova terra, em que habita a justiça” (2Pe 3.13, ver Is 65.17).

A esperança cristã abarca, em segundo lugar, “a libertação dos filhos de Deus” (Rm 8.23-25). Naturalmente, nós, que pusemos nossa fé em Jesus Cristo, já fomos regenerados pelo Espírito. No entanto, a obra de Deus não está terminada em nós: a presença do Espírito é apenas uma antecipação e uma garantia do que ele quer fazer em nossa vida. Ainda estamos sujeitos à enfermidade e à morte; ainda há momentos em que sentimos a opressão imposta pelo “corpo desta morte” (7.24) porque permitimos que o pecado continue dominando em nosso corpo mortal (6.12-13). Por isso sofremos profundamente, “gememos em nós mesmos, esperando a adoção, a saber, a redenção do nosso corpo” (8.23). A referência aqui é a glorificação do corpo por meio da ressurreição. Já somos filhos de Deus (v. 14,16), mas Deus quer que a glória do Cristo ressuscitado se manifeste em nós plenamente. Aguardamos o dia em que nosso corpo mortal (que é corruptível e como tal não pode herdar o reino de Deus) será transformado em um corpo incorruptível, “um corpo espiritual” semelhante ao corpo com o qual Cristo se levantou dentre os mortos (ver 1Co 15.50-52; 1Jo 3.1-3).

A esperança cristã inclui, em terceiro lugar, “a ação do Espírito Santo” em nós, que pusemos a nossa confiança em Jesus Cristo (Rm 8.26-27). Não estamos sozinhos em nossas lutas diante dos fatores que se opõem ao cumprimento de nossa esperança de libertação da criação e do poder da morte. Deus é o Deus da esperança, e ele cumprirá suas promessas de redenção por meio de seu Espírito, que “ajuda as nossas fraquezas” e “intercede por nós com gemidos inexprimíveis... segundo Deus”. Do princípio ao fim, a redenção, objeto de nossa esperança, não é obra nossa, mas sim de Deus.

A esperança cristã dá senso de direção à missão integral e é a base para a perseverança na sua prática. Porque sabemos que o que fazemos dará como fruto sinais do que Deus quer fazer por meio de nós no poder do Espírito, estamos dispostos a continuar a tarefa que Deus nos encomendou, sem desanimar diante das dificuldades. Por isso, em uma passagem impregnada de esperança cristã, o apóstolo exorta os crentes: “Portanto, meus amados irmãos, sede firmes e constantes, sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que o vosso trabalho não é vão no Senhor” (1Co 15.58).
Fonte: http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/362/missao-e-esperanca

March 21, 2017

Sempre mais

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- Rute Heckert

Querer sempre mais – hábito entranhado no modo contemporâneo de viver no estilo "black friday". Autorizados pela cultura do consumismo e do individualismo a valorizar nosso querer, facilmente caímos na armadilha da insatisfação constante, restringindo nossos pensamentos a querer o que não temos. "O que falta cega pro que já se tem"*.

Querer ter mais se confunde com ser mais importante, e nos faz incapazes de identificar os motivos de sermos gratos. Imaginamos algo que não temos, ou não somos, como possibilidade futura, perdendo os pés do presente. Não aceitamos o presente tempo, não valorizamos o presente recebido. Amargor e rancor vão sendo semeados em nosso ser. Sermos gratos, porém, areja, ilumina, nos torna graciosos. É ter graça sem ser tolo ou ingênuo, mas sim dotado de sabedoria, dando foco e brilho ao que se vive e se recebe, acolhendo a graça com humildade, sem se dar mais importância do que ao outro. 


Gratidão anda de mãos dadas com a alegria; sem negar a falta ou a dificuldade, aceitar o que se tem faz a vida leve. Ser grato, contudo, não é estar cego, mas aprender a ver, isto é, a reconhecer o que há de valioso, os presentes presentes. É poder ver o céu espelhado no mar escuro quando este nos dá medo... coisa de quando a alma não é pequena...** O olho que vê poesia pode ver.

Olhar para a própria história e enxergar motivos de gratidão não é tarefa fácil - mágoas e feridas põem-se à frente. Impossível passar a borracha como numa "pseudoamnesia", porém podemos encontrar motivos pelos quais encontramos sentido no viver, o que nos fazem prosseguir. Do contrário, estagnamos. 

Com gratidão, cultivamos alegria, esperança, movimento... a vida tem graça ; ).

*da música “Seja Você”, de Herbert Vianna.
**do poema “Mar Português” de Fernando Pessoa.


Fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/querer-sempre-ter-mais

March 20, 2017

À beira do poço e a gratidão que precede a alegria

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- Lissânder Dias

A gratidão é irmã siamesa da alegria. Mas num mundo incoerente que se atreve a transformar a alegria em um produto de marketing, surge o espetáculo de horror: sorrisos por fora, mas tristeza por dentro. 

Adestrados a fabricar sensações de euforia – como dependentes químicos -, consumimos tudo que nos dê um mínimo de felicidade. Mas investimos quase nada no exercício da gratidão.
A mulher triste num poço
Quando Jesus passou por Samaria, foi até a um poço, por volta de meio-dia, e lá encontrou-se com uma mulher triste – sem família estável, sem uma fé respeitada, sem a fidelidade de um amor verdadeiro. Foi a esta mulher que Jesus pediu um favor: “dê-me um pouco de água”. Ela ficou surpresa com o pedido vindo de um judeu (judeus e samaritanos não se davam bem).
Não foi um simples pedido que exigiria uma mera gentileza. Era uma revelação. A mais básica das solicitações precedia o descortinar do maior mistério: o Messias.
Aparentemente, a mulher é quem deveria dar água a Jesus, mas, ao contrário, foi ele quem ofereceu saciar a sede dela. E para sempre.
A imagem que Jesus cria na mente daquela mulher (e dos leitores de hoje) é interessantíssima. Um poço sem fundo com um líquido eterno. A busca existencial daquela mulher chegaria ao fim, mas o resultado desta busca não. Duraria para sempre numa incessante profusão de alegria.
Aquela mulher triste foi envolvida pela revelação do Cristo e pela certeza de que ele a conhecia como ninguém.
O convite de Jesus para o saciamento veio acompanhado do amor incondicional e gerou a alegria no coração da samaritana. Acompanhe o relato em João 4. Veja como o ânimo dela mudou completamente ao ponto de prontamente espalhar a notícia sobre Jesus para outros (Jo 4.39-41). Agora ela está grata por ter conhecido o Messias, por ter encontrado o que buscava, por ter sido aceita.
Quem não é grato não consegue experimentar nada mais do que momentos de prazer descartável. Quem é preenchido pela gratidão reconhece que foi encontrado pelo Messias e, assim, no fundo do seu ser, aquilo que era amargura, pessimismo, ressentimento e desesperança vai dando lugar ao contentamento, à saciedade. E aí vem a alegria. Naturalmente. Sem alarde, com sinceridade.
Gratidão, apesar de…
A gratidão não surge no vácuo, sem contexto, sem motivo. Ela é fruto da maneira como encaramos a vida, de como interpretamos cada circunstância. Isso não significa fingir que tudo está bem — quando não está. Gratidão não é um virtude de ingênuos. Trata-se de uma maneira sábia e sensível de perceber a realidade como um todo e integrada.
Se nem sempre a tristeza é ilegítima, por sua vez, nem sempre a alegria é real. A vida tem feiura, tem dureza, tem confusão, tem decepção, tem pecados. Nossos corações são maus. Os poderosos muitas vezes são injustos e a sequência existencial nem sempre obedece nossa lógica. Carregamos feridas que ainda causam dores. Temos medo quando uma ameaça de aproxima. Alguém irá negar estas coisas? Não deve. Mas alguém será refém delas? Também não deve.
Se a gratidão precede a alegria, vale dizer que este mesmo sentimento existeapesar de. É um ato de resistência, de superação, de enfrentamento. Somos gratos porque a coragem nos deu condição de enfrentar a vida. Pode do chão seco brotar água limpa.
Gratidão e esperança
Vale a pena lembrar, no entanto, a incompletude da gratidão. Apesar da sensação de saciedade, ela sempre está inacabada, porque em sua essência, o olhar que a move espera que as coisas melhorem. Nem tudo é palpável para quem exercita a gratidão. Mas ao enxergar a graça nos acontecimentos de hoje, o grato já mira, pela fé, a completude do que virá. E caminhamos: incompletos, mas esperançosos.
Foi assim o olhar de Jesus: “abram os olhos e vejam os campos! Eles estão maduros para a colheita” (Jo 4.35). Ainda não vemos o fruto, mas, sem dúvida, ele surgirá.
Não dá para sustentar nenhum tipo de gratidão sem uma migalha que seja de esperança. Quanto a isso, a Palavra de Deus nos enche de motivos. Somos o Povo da Promessa. Somos os que teimam em esperar o Messias. Somos os que aguardam a Colheita. Somos os que sabem que o fim de todas as coisas trará algo melhor do que o que hoje existe.
A mulher samaritana cavou fundo e encontrou alegria. Os seus conhecidos também. O Senhor Jesus ensinou seus discípulos a desenvolverem a esperança de que o trabalho iniciado – mesmo árduo – seria concluído (Jo 4.34).
Gratidão é mais do que bons sentimentos. É antecipar o caminho da alegria. É ser saciado pela água que torna a vida, de fato, eterna.
Fonte: http://ultimato.com.br/sites/fatosecorrelatos/2017/02/15/a-mulher-triste-do-poco-e-a-gratidao-que-precede-a-alegria/