July 12, 2018

Restrição e Liberdade

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Ascese é a prática voluntária de determinados tipos de restrição em relação a necessidades ou abstinência de prazeres, tanto físicos como imateriais. É disciplina espiritual praticada desde o Século III, quando a vida monástica se tornou uma opção à aliança entre o estado imperial e a igreja.

Em resposta, muitos piedosos seguidores de Jesus optaram por um retorno às origens mais humildes da sua fé, ao isolamento nos desertos e a uma vida que priorizasse a simplicidade. 

A sabedoria clássica nos ensina que há três ordens de necessidades humanas que influenciam no equilíbrio necessário à vida devota:
  1. necessidades de base, voltadas à sobrevivência, vinculadas aos instintos (comida, segurança, procriação). São necessidades viscerais, simbolizadas pelo estômago; 
  2. necessidades emocionais, voltadas aos afetos, vinculadas aos sentimentos (aceitação, acolhimento, pertencimento). É a necessidade de sermos amados, vinculada ao coração; 
  3. necessidades espirituais, voltadas à reflexão, vinculadas à razão e à transcendência (busca pelo sentido da existência, controle, culto, devoção). É a espiritualidade, designada, metaforicamente, pela cabeça.
Para cada grupo de necessidades há tipos correspondentes de tentações: gula, violência, lascívia, para os estômagos; ciúme, inveja, traições e maledicências, para os corações; e a busca pelo poder, as manipulações e o controle do outro, para as cabeças.

A ascese se apresenta, no discernimento dos pais do deserto, como o método que busca o enfrentamento pessoal, com o auxílio do Espírito Santo, desses vícios e tentações. 

Por práticas restritivas ou pela abstinência, propõe: os jejuns, que refreiam as bocas ávidas; o silêncio, o calar e o não julgar, que educam as línguas e pacificam os corações; e, por fim, a meditação, as orações incessantes e a contemplação, que iluminam as cabeças e libertam as mentes.

Vivemos um tempo de volúpia existencial (desejos, necessidades e buscas exageradas). A resposta do cristianismo sempre foi a moderação. Afinal, toda a satisfação possível vem de Deus, no relacionamento com a santíssima Trindade, só viável por causa de Jesus Cristo.

De nada adianta a ânsia insana pela autopreservação ou a disposição desvairada de se prestar a qualquer papel apenas para ser aceito ou mesmo o uso de mecanismos de manipulação ou de relações utilitaristas que buscam, apenas, incrementar os lucros e o poder.

A serenidade verdadeira nasce da capacidade de abrir mão. De deixar ir. Na perspectiva daquele que, sendo tudo, a si mesmo se esvaziou por amor, menos é mais. 

Menos exagero para a boca e o estômago famintos; menos vaidade ou bajulação para corações medíocres; menos mecanismos de poder e fuga das responsabilidades para as mentes débeis. 

Aprender a abrir mão, restringir, diminuir e satisfazer-se com aquilo que é essencial é evidência de maturidade espiritual. 

É satisfação que não nasce do excesso, mas da liberdade de dizer não.

Fonte: http://www.ippdf.com.br/comunidade/boletim-da-semana/restricao-e-liberdade/

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