May 18, 2009

A sordidez humana

A sordidez humana
- por Lya Luft

"Que lado nosso é esse, feliz diante da desgraça alheia? Quem é esse em nós, que ri quando o outro cai na calçada?"

Ando refletindo sobre nossa capacidade para o mal, a sordidez, a humilhação do outro. A tendência para a morte, não para a vida. Para a destruição, não para a criação. Para a mediocridade confortável, não para a audácia e o fervor que podem ser produtivos.

Para a violência demente, não para a conciliação e a humanidade. E vi que isso daria livros e mais livros: se um santo filósofo disse que o ser humano é um anjo montado num porco, eu diria que o porco é desproporcionalmente grande para tal anjo.

Que lado nosso é esse, feliz diante da desgraça alheia? Quem é esse em nós (eu não consigo fazer isso, mas nem por essa razão sou santa), que ri quando o outro cai na calçada? Quem é esse que aguarda a gafe alheia para se divertir? Ou se o outro é traído pela pessoa amada ainda aumenta o conto, exagera, e espalha isso aos quatro ventos – talvez correndo para consolar falsamente o atingido?

O que é essa coisa em nós, que dá mais ouvidos ao comentário maligno do que ao elogio, que sofre com o sucesso alheio e corre para cortar a cabeça de qualquer um, sobretudo próximo, que se destacar um pouco que seja da mediocridade geral?

Quem é essa criatura em nós que não tem partido nem conhece lealdade, que ri dos honrados, debocha dos fiéis, mente e inventa para manchar a honra de alguém que está trabalhando pelo bem? Desgostamos tanto do outro que não lhe admitimos a alegria, algum tipo de sucesso ou reconhecimento?

Quantas vezes ouvimos comentários como: "Ah, sim, ele tem uma mulher carinhosa, mas eu já soube que ele continua muito galinha". Ou: "Ela conseguiu um bom emprego, deve estar saindo com o chefe ou um assessor dele". Mais ainda: "O filho deles passou de primeira no vestibular, mas parece que...". Outras pérolas: "Ela é bem bonita, mas quanto preenchimento, Botox e quanta lipo...".

Detestamos o bem do outro. O porco em nós exulta e sufoca o anjo, quando conseguimos despertar sobre alguém suspeitas e desconfianças, lançar alguma calúnia ou requentar calúnias que já estavam esquecidas: mas como pode o outro se dar bem, ver seu trabalho reconhecido, ter admiração e aplauso, quando nos refocilamos na nossa nulidade? Nada disso! Queremos provocar sangue, cheirar fezes, causar medo, queremos a fogueira.

Não todos nem sempre. Mas que em nós espreita esse monstro inimaginável e poderoso, ou simplesmente medíocre e covarde, como é a maioria de nós, ah!, espreita. Afia as unhas, palita os dentes, sacode o comprido rabo, ajeita os chifres, lustra os cascos e, quando pode, dá seu bote.

Ainda que seja um comentário aparentemente simples e inócuo, uma pequena lembrança pérfida, como dizer "Ah! sim, ele é um médico brilhante, um advogado competente, um político honrado, uma empresária capaz, uma boa mulher, mas eu soube que...", e aí se lança o malcheiroso petardo.

Isso vai bem mais longe do que calúnias e maledicências. Reside e se manifesta explicitamente no assassino que se imola para matar dezenas de inocentes num templo, incluindo entre as vítimas mulheres e crianças... e se dirá que é por idealismo, pela fé, porque seu Deus quis assim, porque terá em compensação o paraíso para si e seus descendentes.

É o que acontece tanto no ladrão de tênis quanto no violador de meninas, e no rapaz drogado (ou não) que, para roubar 20 reais ou um celular, mata uma jovem grávida ou um estudante mal saído da adolescência, liquida a pauladas um casal de velhinhos, invade casas e extermina famílias inteiras que dormem.

A sordidez e a morte cochilam em nós, e nem todos conseguem domesticar isso. Ninguém me diga que o criminoso agiu apenas movido pelas circunstâncias, de resto é uma boa pessoa.

Ninguém me diga que o caluniador é um bom pai, um filho amoroso, um profissional honesto, e apenas exala seu mortal veneno porque busca a verdade. Ninguém me diga que somos bonzinhos, e só por acaso lançamos o tiro fatal, feito de aço ou expresso em palavras. Ele nasce desse traço de perversão e sordidez que anima o porco, violento ou covarde, e faz chorar o anjo dentro de nós.

Fonte: Veja, 17/05/09.

May 14, 2009

Retrógrado

FSP, 10/05/09
Mestres do tempo
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- por Gilberto Dimenstein

É um dos presentes mais inusitados que alguém já ganhou no Dia das Mães: um salto de paraquedas. Ainda mais quando a homenageada tem mais de 70 anos. Mas esse presente foi em 2008. Neste ano, Geralda Ferreira de Araújo está aprendendo a pilotar uma asa-delta.

Geralda é um dos personagens de um ensaio fotográfico, ainda em andamento, intitulado "Mestres do Tempo", sobre brasileiros, anônimos ou famosos, que não perdem a curiosidade e, por isso, se mantêm interessados e interessantes.

Ela é a caçula da turma - a maioria já passou dos 80 anos. Tatiana Belinky, 90, só começou a escrever livros infantis aos 56 anos e nunca mais parou. "Nunca fiz planos, foram os planos que me procuraram."

Faz meio século que Benedito Sbano, 81, é o palhaço Picoly. A velhice não abalou seu ritual de passar várias horas por semana em frente ao espelho testando novas caretas ou treinando a voz. "Estou sempre sonhando com coisas novas para minhas apresentações. Deixo a idade passar, não me preocupo com isso."

Diana Tannos fez parte da primeira turma de medicina da PUC em Sorocaba, em 1951 - a primeira escola de medicina do interior de São Paulo. Está agora com 80 anos, continua dando aula de histologia e nunca perdeu o hábito de se atualizar com os novos conhecimentos científicos. "O médico deve sempre ter tempo para estudar."

Pergunto à responsável pelo projeto, Alessandra Trindade, o que ela encontrou de comum entre os personagens que escolheu. "Parece que todos não têm tempo de ficar pensando no tempo passar, de tão focados que eles são nos seus projetos."

Pessoas tão velhas, vindas do início do século passado, quando ainda faltava muito para a televisão ser descoberta e o telefone era quase uma novidade no Brasil (as ligações interurbanas exigiam extrema paciência), exibem uma dica de contemporaneidade. Num mundo apressado (e cada vez mais apressado), elas revelam a arte de lidar com o tempo - e não ser refém dele.

Nós nos consideramos avançados porque, agora, temos ao nosso alcance o tempo real, mas cada vez menos sabemos como lidar com o tempo, numa ansiedade constante do excesso de informação.

Uma das mais interessantes críticas que já vi sobre o culto exacerbado é uma brincadeira tecnológica feita por um grupo de estudantes americanos.

Colocaram um sensor na privada, conectado ao Twitter, treinado para traduzir em instantes (e para todo o planeta) os movimentos intestinais. O nome do projeto é uma gozação intitulada "Shit Happens", que, além da alusão direta, é uma expressão que significa algo como "desastres acontecem".

Críticas retrógradas à tecnologia não são novidade, apenas revelam o medo do novo. Novidade é que, aos poucos, vai se disseminando uma visão de que retrógrado é não saber lidar com o tempo e ficar refém e sem foco diante de tanta informação.

Prospera o movimento do slow food em contraposição ao fast food. O tempo médio de leitura do site do jornal "New York Times" não passa de dois minutos - bem menos do que o tempo de espera em qualquer semáforo.

Retrógrado é não saber desligar nunca o computador, não parar de ver e-mail, onde o lixo se amontoa. É ter o prazer de conversar com alguém desconhecido ao longe, mas não enxergar quem está perto. É não saber contar ou ouvir uma boa história. É não ter paciência de ler um romance, com as profundezas da natureza humana. É não saber ficar em silêncio.

É ficar trancado horas e mais horas num quarto na frente de um computador. É nunca sentir, como dona Geralda, o prazer de se jogar, no Dia das Mães, de um paraquedas ou aprender a voar numa asa-delta, ou o encanto de um palhaço que tenta se reinventar, na frente dos espelhos, todos os dias. Ou de uma escritora infantil que se sente mais criança do que seus leitores.

Por essas e outras é que considerei um avanço a obrigatoriedade do ensino de filosofia nas escolas - é assim que se pode conhecer um pouco mais os vários mestres do tempo.

PS - Há um fato que merece registro sobre o livro "Mestres do Tempo", mas está atrás da câmera. A tarefa de fotografar aqueles personagens foi dada a um adolescente (Victor Dragonetti) que ainda está no ensino médio. "Muitos deles parecem mais jovens do que eu", conta.

Coloquei no meu site algumas das fotos, que incluem, entre outros, dona Canô (mãe de Caetano Veloso), Cleyde Yaconis, Altamiro Carrilho e Dorina Nowill.

Fonte: http://aprendiz.uol.com.br/content/shuphicuve.mmp

May 13, 2009

'Todo mundo é melhor do que pensa que é

Todo mundo é melhor do que pensa que é - 09/05/09
Cerca de um mês antes de sua morte, o diretor Augusto Boal concedeu esta entrevista em Paris

- por Taíssa Stivanin, PARIS

No dia 25 de março, o dramaturgo, diretor e ensaísta Augusto Boal recebeu na sede da Unesco, em Paris, o título de Embaixador Mundial do Teatro. Poucas horas antes, no hall de um hotel na praça da República, na capital francesa, o criador do Teatro do Oprimido concedeu uma de suas últimas entrevistas. Boal, que morreu dia 2, no Rio, aos 78 anos, tinha chegado a Paris um dia antes de nossa conversa. Fui buscá-lo no quarto. Mancando, ele contou que tinha ordens médicas para não deixar o hospital, mas disse que não perderia a oportunidade de receber o prêmio por nada. Se o dramaturgo estava fisicamente tão debilitado, isso só ele sabia. Seu espírito e sua energia continuavam intactos. Bem-humorado, falante, gesticulando muito, e sem pedir nem um copo de água, o dramaturgo conversou sem se cansar. Desse papo, ficou a mensagem que resume sua vida: "Todo mundo pode fazer melhor do que acha que está fazendo." Seu teatro é a descoberta dessa capacidade.

O sr. acompanha o trabalho do Teatro do Oprimido em Paris?

Em Paris acompanho pouco. Meu filho, Julian Boal, integra um grupo que se chama Grupo do Teatro do Oprimido. Existem vários lugares na França que fazem o teatro do oprimido. O movimento Planning Familial (Planejamento Familiar) o utiliza há muitas décadas em seu trabalho. As escolas e as ONGs também. Acompanho como posso. No site internacional do Teatro do Oprimido, existem mais de 50 países nomeados e 200 grupos. Mesmo no Brasil, ele está presente em todos os Estados, menos no Amazonas, Pará e Roraima, pois custa muito caro desenvolver um projeto por causa da distância. O volume de trabalho é imenso, na Índia, na África. Quando algum grupo introduz uma técnica diferente, a gente tenta seguir. No mais, a gente aplaude.

O sr. vai muito à Escandinávia? Como o trabalho se desenvolveu lá?

Começou na Suécia há 30 anos. Tinha amigos exilados, que nos anos 70 me convidaram para fazer uma oficina. Fui voltando nos anos seguintes. Durante muito anos fui para a Suécia e a Noruega. Mas agora canso muito se pego avião sempre. Meu filho leva o trabalho adiante. O Julian, segundo ele mesmo, faz o mesmo trabalho que eu, mas muito melhor (risos).

Ele acreditou no potencial dele, e essa responsabilidade é sua...

Exatamente, você matou a charada. Dizia para o Julian que ele era melhor do que pensava, ele acreditou. E me respondia: "Sou mesmo." Julian trabalha muito no exterior. Na África, na Ásia. Na Índia, existe a Federação Indiana do Teatro do Oprimido. Em 2006, ela reuniu 12 mil pessoas numa praça em Nova Déli. Foi muito lindo de ver, porque 80% eram mulheres, vestidas com seus saris coloridos.Ver aquelas mulheres resolutas, fortes, gritando slogans, cantando hinos sobre teatro, sobre Arte, foi muito bonito. A Arte, afinal, pertence a elas. O Teatro do Oprimido está espalhado por toda a Índia, pelo Paquistão, pelo Sri Lanka. No Sri Lanka, quando houve o tsunami, eles faziam o arco-íris do desejo no campo de refugiados para tentar entender como ficou a cabeça das pessoas depois de um desastre daquelas proporções. É o que que queremos. Criar multiplicadores criativos. Multiplicar um sistema que já existe. O que importa é para quem você faz. Como aplico esse método para essas pessoas, nesse lugar e com esses problemas?

Como está a aplicação do método nos presídios brasileiros?

A cadeia é o único lugar onde temos problemas para trabalhar, por conta de tanta burocracia. É um trabalho que está parado atualmente, mas tivemos experiências maravilhosas. Havia uma prisão no Estado de São Paulo que parecia um leprosário, ninguém chegava perto de ninguém. Conseguimos trazer os prisioneiros para o meio da praça, usando o teatro-fórum, como se fossem cidadãos livres. Eles entraram em cena e contracenaram com os outros. Deu certo. Os presos aceitaram que estavam pagando pelos crimes que cometeram e voltariam a viver em sociedade se fosse possível. Uma vez fizemos uma peça onde um preso contava sua história, trágica. Ele era inocente e estava preso há dois anos porque não sabia como se defender. Durante sua apresentação, coincidentemente, tinha uma juíza na plateia. Espantada, ela prometeu o alvará de soltura dele e cumpriu. Situações como essas, existem muitas. Numa cadeia paulista onde aplicamos o teatro legislativo, por exemplo, conseguimos fazer creches para as detentas que tinham filhos. O problema é a burocracia. Os funcionários do Depem, órgão que administra as cadeias, são impenetráveis. Na cabeça deles não entra nada. Não compreendem que o que está na lei tem de estar subordinado a um bem maior. Sei que a lei deve ser obedecida. Existe uma lei que diz: é proibido pisar na grama. Não quero pisar na grama, porque acho que é uma lei justa. Mas se uma criança está sendo atacada por um cachorro, você tem de pisar na grama, dar um pontapé no cachorro e salvar a criança. Violar a lei às vezes é necessário. Trabalhamos também com o Ministério da Cultura em 16 Estados, e com o Ministério da Saúde, nos Capes (Centros de Atendimento Psicossocial). Tentamos enquadrar o delírio patológico no delírio estético. Afinal, teatro é uma forma de delírio, uma forma de alucinação.Também trabalhamos em comunidades violentas. A violência ocorre pela obtusidade das pessoas. Alguns continuam nesse caminho, mas outros felizmente entendem que o diálogo é a forma soberana da comunicação.

No contexto da globalização, da sociedade de consumo, o seu método pode ser aplicado da mesma forma que há 30 anos ou precisa ser readaptado levando em consideração as mudanças sociais?

O Teatro do Oprimido se torna mais útil ainda nesses novos tempos. Ele é o contrário da globalização, faz parte da mundialização. A globalização é uma pirâmide da desigualdade. No topo, ficam os ricos, as pessoas desonestas, responsáveis pelo crash da bolsa e a crise mundial. A globalização é uma fagocitação, esses ladrões todos querem comer os outros. É uma coisa antropofágica. A mundialização não. Se você tem um saber, você tem de espalhar esse saber. Não pode ser aquele sábio que vive no topo de uma montanha. Isso me lembra uma piada mineira. O homem pergunta: "Senhor sábio, o que é a vida?" O sábio responde: "Meu filho, a vida é um rio." "Um rio?", desconfia o homem. O sábio vacila: "Uai, não é não?" Esses velhos sábios não me interessam. Temos de ser generosos e solidários com os outros e deixar que eles usufruam do seu saber.

Poderia esclarecer um pouco as derivações do Teatro do Oprimido? Teatro Legislativo, invisível....

O Teatro do Oprimido é uma grande árvore. Essa árvore tem as raízes na ética e na filosofia de humanizar a humanidade. É a nossa base. Depois começam os jogos, para restaurar a capacidade criativa das pessoas. Em seguida, vêm os diversos ramos da árvore, como o teatro invisível, o teatro legislativo, o arco-íris do desejo, que serve para exteriorizar as opressões internalizadas. O mais usado é o teatro-fórum, que significa colocar um problema e discutir teatralmente esse problema. É a forma mais difundida, porque produz resultados mais imediatos. O arco-íris do desejo requer uma reclusão maior, em grupos pequenos. Trata problemas individuais. Todas as formas de teatro são úteis, têm uma função. O sucesso extraordinário desse teatro, no mundo todo, se deve à revelação de que o teatro não é o palco, não são as luzes, não é um texto escrito necessariamente, não é iluminação, não é nada disso. Teatro somos nós. Cada um de nós traz em si mesmo um ator. Nesse momento, por exemplo, estou sendo ator. Estou agindo e ao mesmo tempo sendo espectador. Estou ouvindo o que estou dizendo, minha voz, estou pensando no que vou dizer. Teatro é isso. Você percebe que pode avançar num sentido que não é aquele previsto pela sociedade, tecnicamente e mecanicamente. Você sai da moldagem e passa a ser você mesmo, descobrindo coisas insuspeitadas. Que você é melhor do que você pensa que é. Todo mundo é melhor do que pensa que é. Todo mundo é mais capaz de fazer o que já está fazendo. Meu teatro é a descoberta dessa capacidade.

O que ainda falta fazer?

Já fiz muita coisa e tenho intenção de fazer muitas mais. Estou terminando um livro que se chama As Estéticas do Oprimido. Muita gente fala de diversidade cultural, o que defendo. Mas quando pensa em estética, pensa em uma só. Como ser diverso culturalmente, com uma só estética, se a estética é produto de uma cultura? Por exemplo, aquele pintor norte-americano, Jackson Pollock. Nos Estados Unidos, todo mundo acha que ele é um gênio. Leva uma pintura dele para Bangladesh e pergunta o que vão achar. Tudo isso para dizer que os americanos criam a estética deles, da Guggenheim Foundation. Tudo isso para dizer que não existe uma soberana estética à qual todos nós devemos nos curvar e obedecer.

No ano passado, seu nome teria sido cogitado para o prêmio Nobel da Paz, como recebeu a notícia?

Não tenho nada com isso (risos). Achei muito simpático, principalmente porque recebi indicações dos cinco continentes. Até na Austrália, que é do outro lado do mundo, recebi cartas de apoio.Pelo que soube, o que ficou faltando foi o apoio de algum Prêmio Nobel. Não tem importância, não me preocupo se vou ganhar ou não neste ano. Mas tenho muito orgulho de ter sido indicado.

E sua história com a química?

Sou engenheiro químico porque meu pai queria que eu fosse doutor e teatro não dava doutorado na época. Tinha uma namorada de quem eu gostava muito e ela foi fazer Química. Fui atrás. Entrei na faculdade e ela não, acabou fazendo Letras. Eu não era o primeiro aluno da sala, mas não era o último. Ficava na média. Mas já esqueci tudo. Só lembro que a fórmula da água é H2O.

Esta entrevista com Boal foi concedida originalmente à Rádio França Internacional (RFI).

Livro inédito

TESTAMENTO: O Teatro do Oprimido, de Boal, é uma metodologia cênica que ele desenvolveu nos anos 70 e combina drama e ação social. Poucos dias antes de morrer, o embaixador mundial do teatro pela Unesco entregou à editora Garamond o texto final do seu novo livro, A Estética do Oprimido. Já considerado o testamento artístico de Boal, o livro sintetiza suas principais concepções sobre arte e deve ser publicado ainda em 2009. Boal abre o livro com uma dedicatória: "Sinto sincero respeito por todos aqueles artistas que dedicam suas vidas à sua arte - é seu direito ou condição. Mas prefiro aqueles que dedicam sua arte à vida."

Fonte: OESP, Caderno 2, 09/05/09 (sábado).