May 29, 2013

O Espírito Santo na espiritualidade contemporânea

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- Ricardo Barbosa de Souza

No Evangelho de João, Jesus explora um binômio importante para a compreensão da pessoa e da obra do Espírito Santo na vida cristã. De um lado, ele afirma que o diabo é mentiroso e pai da mentira, que tudo o que ele faz procede da mentira e do engano. De outro, afirma que o Espírito Santo é o Espírito da verdade que nos é enviado pelo Pai para nos ensinar a guardar tudo quanto o Filho nos tem ensinado, e que nos guiará a toda a verdade. Mentira e verdade são dois antônimos que nos ajudam a compreender o papel de cada um.

A missão do diabo é manter o homem alienado, imerso num mundo falso, preso a toda sorte de enganos e sem contato com a realidade. Como ele não é capaz de criar nada, pois a mentira não tem nenhum poder de criação, age dissimulando a verdade e seduzindo com a ilusão. Talvez nada ilustre melhor esta incrível habilidade de dissimulação do que a cultura das drogas. O vício é uma dissimulação da realidade, que cria artificialmente uma sensação que não é verdadeira - é uma ilusão que seduz e cativa. Entramos sem muita consciência do que estamos buscando e, pouco a pouco, vamos perdendo o contato com a realidade e nos tornando mais e mais dependentes da droga ou mesmo de algum hábito. Precisamos de doses mais fortes, experiências mais extravagantes, sensações mais loucas.

O viciado vive num mundo onde somente a droga é capaz de dar-lhe algum sentido, ainda que passageiro. Quanto mais dependente, mais distante encontra-se da realidade. Mas não são apenas os vícios que nos alienam da verdade. Hoje temos a grande indústria do entretenimento e da televisão, que fabrica realidades. Quem já visitou a Disneylândia sabe do que estou falando. É um lugar mágico, onde as fantasias acontecem. Crianças e adultos se encontram, desavenças desaparecem, problemas parecem não existir. Temos a sensação de que seria maravilhoso morar ali e gozar para sempre daquele êxtase e daquela alegria.

A televisão também é uma grande fábrica de ilusões. Ela é capaz de nos fazer chorar de emoção por algo que, na experiência real, nos faria chorar de raiva ou de ódio. Ela estabelece padrões de beleza, de sucesso, de felicidade e de prosperidade. Muitos jovens sentem-se feios, complexados ou inadequados porque a falsa realidade criada pela televisão os leva a se sentirem assim. Ela determina gostos e modas, inclui e exclui, apresenta uma falsa intimidade. Temos uma ilusão da realidade, da intimidade. Tudo isso dissolve a realidade.

Com a perda da realidade, perdemos a identidade. Perguntamos: "Quem sou eu? Qual o sentido para minha vida?" Somos apenas uma expressão da moda, da massificação da sociedade, do consumismo, da obsessão pelo sucesso. Roubaram nossa singularidade. É isto que a mentira faz. Ela nos aliena de Deus, do próximo e de nós mesmos. Quanto mais mergulhamos nos vícios, nos desejos desordenados, nas simulações da verdade, mais ouvimos alguém dizer que precisamos de doses mais fortes, de experiências mais estimulantes, de aventuras mais radicais, de prazeres mais exóticos. Tornamo-nos narcisistas, com uma falsa admiração por nós mesmos, que logo desaparece com um pequeno movimento daquela água.

No entanto, o Espírito Santo é o Espírito da verdade, que nos guia a toda a verdade. Ele é o Espírito que vem para libertar nosso espírito aprisionado pela mentira e pela ilusão do pecado, para quebrar a casca da semente e deixar crescer a planta, tirar as máscaras do rosto e revelar quem verdadeiramente somos. Ele é o Espírito da transcendência, que nos liberta de nós mesmos e nos lança em direção a Deus e ao próximo, conduzindo-nos até as esferas das realidades de Cristo. É ele que abre nossos olhos para buscarmos as coisas lá do alto, transforma nossas mentes para pensarmos nestas coisas e desejarmos aquilo que é verdadeiro, que se encontra oculto em Cristo.

Tenho visto muita gente, muitos irmãos e irmãs, que têm construído suas vidas e sua espiritualidade sobre falsas realidades, sobre simulações da verdade. Encontram-se aprisionados pelo engano e pela mentira. Correm atrás de falsas realizações e buscam se ajustar ao espírito do mundo que nega a verdade. O Espírito da verdade nos é enviado para nos guiar a toda a verdade, para nos levar ao conhecimento de nós mesmos na presença de quem nos conhece verdadeiramente.

É por esta razão que ele sempre nos conduz a Cristo. Yves Gongar foi quem disse que o Espírito Santo é o Deus sem face. Disse isto para demonstrar a anonimidade da pessoa do Espírito Santo. Tom Smail diz que "nós conhecemos o Espírito, não porque temos um encontro face a face com ele, como temos com o Filho e, por meio do Filho, com o Pai. Em vez disso, passamos a conhecer o Espírito quando começamos a entender que nossa capacidade de reconhecer e responder a Cristo e ao Pai não tem sua fonte em nós, mas nos é dada de fora de nós mesmos. O Espírito fica conosco, do nosso lado, no encontro com o Pai e o Filho, permitindo a nós conhecê-los e confiar neles".

Ao conduzir-nos à verdade, ele nos conduz a Cristo, verdadeiro homem, verdadeiro Deus, o único capaz de transformar nossa humanidade confusa numa humanidade verdadeira e redimida. É por intermédio dele que o amor de Deus manifestado através de Cristo é derramado em nossos corações, levando-nos a conhecer a verdadeira natureza de ser amado e amar. À medida que vamos sendo conduzidos à verdade pelo Espírito da verdade, experimentando o amor com que Deus nos ama em Cristo e conhecendo-nos como verdadeiramente somos, caminhamos de glória em glória num processo de transformação na imagem de Cristo.

É neste processo que o Espírito glorifica o Filho. Glorifica-o na confissão do seu nome, na proclamação do Evangelho, na adoração da Igreja, na santidade dos santos, no sofrimento e na morte dos mártires, na obediência e na comunhão. Como diz Tom Smail, "por si mesma, a Igreja jamais poderia pintar um retrato do Filho de Deus encarnado. O único artista habilitado para tal tarefa precisa ser da mesma estatura do modelo. Apenas o Espírito divino pode glorificar apropriadamente o Filho divino através da Igreja".

O Espírito da verdade é que nos conduz à verdade, ajuda-nos a compreender, discernir e encarnar tudo quanto Jesus ensinou. É ele que nos liberta do aprisionamento do nosso espírito para vivermos a vida verdadeira que há em Cristo. Em tudo isso, o Filho é glorificado.

Jesus disse que o mundo não conhece nem pode conhecer o Espírito da verdade. Há uma rejeição natural da humanidade para com a verdade. Todos nós, crentes inclusive, preferimos naturalmente viver numa pseudo-realidade, iludindo-nos com falsas promessas de prosperidade e sucesso ou tomando os atalhos dos modismos religiosos, do que entrar no mundo real de Deus - conhecendo-nos como Deus nos conhece, reconhecendo em nós o pecado como ele nos é revelado pela imagem de Cristo e vivendo uma experiência real de confissão, perdão e transformação, a fim de encontrar em Cristo uma humanidade verdadeira.  

Fonte: http://www.lideranca.org/cgi-bin/index.cgi?action=viewnews&id=245
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