O elogio do fracasso
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- Daniel Martins de Barros
O ser humano adora um vencedor. Parece que viemos com algum software mental pré-instalado que nos leva a incensar o mais forte, o mais rápido, o mais hábil. De repente passamos na frente da TV e está passando luta greco-romana, Estônia contra Irã, e no instante seguinte lá estamos nós, torcendo por um deles, desejando o sucesso.
Medimos o sucesso apenas pelo que ganhamos, mas bem poderíamos ser mais felizes se o medíssemos também pelo que deixamos de perder.
- Daniel Martins de Barros
O ser humano adora um vencedor. Parece que viemos com algum software mental pré-instalado que nos leva a incensar o mais forte, o mais rápido, o mais hábil. De repente passamos na frente da TV e está passando luta greco-romana, Estônia contra Irã, e no instante seguinte lá estamos nós, torcendo por um deles, desejando o sucesso.
Essa palavra, no entanto, é uma das mais traiçoeiras da nossa era. Nós medimos o sucesso pelo que foi conquistado, pelo que se ganhou, o que se alcançou. A medalha de ouro. A promoção. O primeiro milhão. O casamento. Sucesso. Mas tudo tem um preço, e vendo a vida dos atletas, a dedicação, a abnegação, a busca pelo limite, me pergunto se o preço não é tão alto a ponto de tornar o fracasso uma alternativa atraente. Não para os torcedores, é claro, essa massa implacável que só se interessa pela vitória. Mas para os próprios esportistas. Lembro de uma entrevista em que César Cielo contava o que precisou fazer para chegar ao alto do pódio na natação mundial. Afastou-se da família. Não tinha tempo para namorar. Abriu mão de uma infinidade de lazeres e prazeres em função de seu objetivo. Conquistou o sucesso. Segundo seus parâmetros, pelo menos.
Porque se invertermos o olhar, poderíamos medir o sucesso não apenas pelo que foi obtido, mas também pelo que foi sacrificado. Para ficar no exemplo do esporte, existem milhões de ex-atletas trabalhando em escritórios, hospitais, lojas, amargando uma enorme frustração porque não alcançaram o topo de suas carreiras esportivas. Por outro lado, é gente que come o que quer, dorme o quanto quer, tem tempo para a esposa, para os filhos – teve até tempo de fazer filhos. Medir o sucesso só pelo que obtiveram no esporte pode fazê-los parecer fracassados. Mas olhar para o que deixaram de perder, para tudo o que ganharam em sua vida comum, leva a pensar se o fracasso não foi uma benção. O mesmo vale para empresários, médicos, pilotos, engenheiros – não é possível chegar ao topo sem uma boa dose de sacrifício. Profissionais que não foram tão longe certamente se pouparam de muita privação.
Não se trata aqui de uma crítica do sucesso. Longe de mim. Quem sou eu para criticar um atleta que se afasta da família para ganhar o ouro? Cada um escolhe o preço que quer pagar. Trata-se, antes, de um elogio do fracasso. Ou do sucesso às avessas. Do exercício de nos lembrar que cada momento na vida é vivido às custas de outros, e que é preciso ter em mente que todos têm valor para poder calcular direito se vale o sacrifício.
Não “chegar lá” pode não ser problema nenhum se dermos o devido valor ao “ficar aqui”.
Fonte: http://vida-estilo.estadao.com.br/blogs/daniel-martins-de-barros/o-elogio-do-fracasso/
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