November 26, 2018

Inteiro

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- Ricardo Barbosa

A ambigüidade é uma marca de nossa cultura e da vida religiosa. Falamos, comentamos e ensinamos a santidade de Deus, mas fugimos dela. Insistimos no valor da vida comunitária, mas não queremos nos envolver com ela. Afirmamos que Jesus é o Senhor, mas não queremos obedecê-lo. A graça nos fascina, mas frequentemente justificamos nossa existência e experiências nos comparando com outros. Queremos a vontade de Deus, mas temos receio do que ele pode fazer conosco. 

Um coração perfeito, inteiro, íntegro, é aquele que não é instável, que não pula de um lado para o outro, que sabe para onde caminha e o que quer. A integridade se dá quando as convicções estão em harmonia com as ações. Quanto a realidade interna e a externa, a postura pública e a privada não se encontram em conflito.

Esta é a preocupação da carta de Tiago. Ele aborda alguns temas que descrevem a falta de integridade na mente e no coração dos cristãos. O primeiro envolve a integridade entre o ouvir e o praticar a Palavra de Deus. 

Ouvir e não praticar produz, ao longo dos anos, um dano profundo na alma humana – desenvolvemos a habilidade de mentir para nós. Jesus falou sobre isto no sermão do monte e comparou o ouvinte não praticante a uma pessoa que perdeu a sanidade.

Um segundo tema que Tiago explora é a forma seletiva como nos relacionamos, tratando com honra algumas pessoas e com descaso outros. Nossos relacionamentos não obedecem um princípio integrador de valores, mas interesses mesquinhos e oportunistas. Afirmamos o mandamento de Deus de amar o próximo, mas tratamos com graves diferenças as pessoas que se aproximam de nós.

Um terceiro tema que Tiago considera é sua famosa tese da fé sem obras. Para ele, a fé verdadeira vem sempre acompanhada das obras, posturas, condutas, atitudes correspondentes. Não existe um discurso apropriado sobre a fé. A única credencial verdadeira para a fé são as obras que a acompanham.

Outra incongruência apontada por Tiago é o poder e a falta de integridade com a linguagem. Nossas conversas revelam a enorme ruptura na mente e no coração. Com nossa língua abençoamos e amaldiçoamos. Ensinamos as verdades mais gloriosas das Escrituras no domingo e as negamos no resto da semana.

Diante de tudo isto, Tiago levanta a pergunta: “De onde procedem guerras e contendas que há entre vós?” Nossos relacionamentos são inconsistentes. A espiritualidade é falsa. As convicções não dizem respeito a vida. Não temos um coração íntegro, inteiro, totalmente voltado para Deus e sua Palavra. 

Nossas orações surgem destas ambiguidades. Queremos ser amigos de Deus e do mundo e Tiago insiste dizendo “infiéis, não compreendeis que a amizade do mundo é inimiga de Deus? Aquele, pois, que quiser ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus”. 

Quero concluir com duas recomendações de Tiago. 

A primeira é de caráter bem pessoal. Ele diz: “Aproximem-se de Deus, e ele se aproximará de vocês! Pecadores, limpem as mãos, e vocês, que têm a mente dividida, purifiquem o coração. Entristeçam-se, lamentem-se e chorem. Troquem o riso por lamento e a alegria por tristeza. Humilhem-se diante do Senhor, e ele os exaltará”. Que conselho fabuloso! Um chamado a viver de forma íntegra. Rimos de nossa falta de integridade. Criamos uma falsa alegria. Tiago nos convida a sermos verdadeiros. Se não temos motivos para rir, choremos. Se não temos motivos para nos alegrar, lamentemos. É somente com um coração íntegro e verdadeiro que Deus vem e nos exalta.

A segunda recomendação é de caráter comunitário. No final de sua carta Tiago nos chama à oração. Não à oração privada, particular, dentro do quarto. Mas a oração comunitária. Orar com quem sofre e cantar louvores com quem encontra-se feliz. Orar com os enfermos, ouvir as confissões uns dos outros e ajudar o irmão(ã) que se afastou da verdade a voltar. A experiência comunitária tem o poder de levantar o doente, perdoar o pecador e curar os que tem o coração ferido pelas rupturas e fraturas de uma fé sem obras.

Humilhação pessoal e vivência comunitária são os dois meios que Tiago sugere para ter um coração e mente íntegros diante de Deus e dos homens. Salomão, depois de sua oração de consagração no templo, se volta para o povo e termina com este apelo: “Seja perfeito o vosso coração para com o Senhor, nosso Deus, para andardes nos seus estatutos e guardardes os seus mandamentos, como hoje o fazeis” (1 Rs. 8:54-61).

Fonte: http://bencaopura.blogspot.com/2016/11/o-coracao-dividido.html

PS- Para ouvir a trilha do dia, vai lá: https://www.youtube.com/watch?v=wH8StWFSw2s
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