March 05, 2021

Dando sentido à fé e às emoções

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- Ricardo Barbosa

A fé cristã tende a permanecer impessoal e subjetiva até sermos colocados diante de situações que requerem de nós uma resposta pessoal e objetiva. O problema para muitos cristãos que cresceram numa cultura racionalista e pragmática é que só conseguem dar sentido à sua fé se ela for sistematizada e funcional. Porém, existe um outro lado dessa moeda, em que a fé só ganha significado quando ela for também pessoal, e não apenas racional; quando ela envolve nossas emoções, e não apenas a razão. Mesmo possuindo a fé solidamente fundamentada em verdades bíblicas, muitos cristãos entram em crise ao passarem por experiências pessoais dramáticas e serem forçados a olhar para si mesmos e para o próprio coração, e a perguntar se tudo aquilo que sempre professaram faz algum sentido naquela situação particular que estão vivenciando.

Na conversa de Jesus com Marta, quando seu irmão Lázaro morreu, Jesus disse a ela que seu irmão haveria de ressurgir. Marta concordou dizendo que ele iria ressuscitar no último dia. Jesus, porém, lhe disse: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que morra viverá; e todo o que vive e crê em mim não morrerá, eternamente. Crês isto?”. A fé que Marta tinha na ressurreição precisava agora de uma resposta pessoal para uma situação específica. “Você crê no que eu estou afirmando?”, foi a pergunta pessoal de Jesus a Marta.

Numa outra ocasião, enquanto o Mestre dormia tranquilamente no barco, os discípulos de Jesus, ao enfrentarem uma tempestade, acordaram desesperados, pois o medo de perecerem era imenso. Jesus acordou, repreendeu o vento e a fúria das águas e perguntou aos discípulos: “Por que vocês são tímidos? Por que a fé de vocês é tão pequena?”. Eles precisavam mostrar que a fé deles, naquela circunstância, era uma fé que fazia sentido para aquela situação particular.

A gramática da fé não é apenas racional sobre doutrinas bíblicas, é também uma gramática pessoal de relacionamento. Posso ter conhecimento das doutrinas bíblicas, dos atributos de Deus e ajustá-los dentro de um sistema racional de convicções, mas posso também nunca ter experimentado, pessoalmente, o significado da fidelidade ou misericórdia de Deus numa situação particular da minha vida. É comum encontrarmos pessoas que abandonaram a fé, ou se tornaram cínicas ou céticas, mesmo tendo demonstrado, durante anos, conhecimento das doutrinas cristãs e envolvimento com os programas religiosos. O problema é o pouco ou nenhum envolvimento pessoal e emocional com essa fé.

Viver pela fé envolve essas duas realidades. É fundamental termos nossa fé ancorada nas Escrituras Sagradas e no testemunho do povo de Deus na história bíblica, porém é igualmente fundamental dar um significado pessoal a essa mesma fé, fazendo com que ela dê sentido às experiências pessoais de cada um. É comum professarmos a fé num Deus bondoso e fiel e, diante de uma tempestade em que nos vemos ameaçados de morte, encontrarmos um Deus distante, frio e impessoal. A gramática racional da fé não é, necessariamente, a gramática emocional e afetiva da fé. As provações, como afirma Tiago em sua carta, são provações da fé, e elas afetam nossas emoções, quando geram medo, angústia e ansiedade. Porém, quando enfrentadas honestamente, nos tornam perseverantes e, por fim, nos levam à integridade. Em outras palavras, as provações integram a razão com as emoções no exercício de uma fé sadia.

Fonte: https://www.ultimato.com.br/revista/artigos/380/dando-sentido-a-fe-e-as-emocoes

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