January 31, 2016

Recomendações para 2016 (2017, 2018...)

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- Ricardo Morais Borges

Sempre que começamos um novo ano ou etapa da vida, se abre a oportunidade para revisar ou mudar algo, deixar ou renunciar maus hábitos, adicionar novas e importantes disciplinas para uma vida saudável, talvez ainda para iniciar novos projetos.

Jesus nos disse que se quiséssemos construir uma torre (Lc 14.28-30), deveríamos calcular os recursos, a energia de reserva, a força e a sabedoria que buscaremos ter nos desafios que enfrentaremos adiante. Nesse contexto e motivação, pensemos juntos em algumas breves recomendações para iniciar um novo ano.

1. Não confie em heróis, nem em você mesmo.

Em época de crises e desesperanças, é tentador buscar consolo na busca de heróis referentes, imaginar que messianismos de um iluminado ou iluminada serão como que a solução mágica para muitos problemas.

Eu me lembro de uma conversa quando visitei a casa de um dos sobreviventes da tragédia dos Andes, aquele voo em que 45 passageiros viajavam do Uruguai ao Chile, em 1972, quando o avião caiu. Mais de dois meses isolados na montanha, em meio a muita neve e frio extremo, dois dos sobreviventes atravessaram os Andes a pé e assim os 16 sobreviventes foram resgatados, 72 dias depois do acidente.

Um desses jovens que atravessou a pé a cordilheira é hoje um médico cardiologista, Roberto Canessa. Roberto recebeu a mim e a um grupo de estudantes em sua própria residência. Muitos livros foram escritos e alguns filmes foram rodados sobre essa história. Por isso eu lhe perguntei por que achava que essa história atraía tanto a nossa atenção. Ele me disse: “Eu acho que as pessoas precisam de heróis”, no seu jeito simples de quem não se via como um herói e que entendia apenas ter feito o que deveria ter feito naquele momento de crise. Me lembrei das palavras de Jesus sobre servos inúteis que apenas cumprem o seu dever (Lc 17.10).

É muito melhor a gente esperar e trabalhar para que cada um cumpra bem seu papel na vida, do que ficar esperando que uma pessoa sozinha vá resolver tudo. Pior, e bastante perigoso, quando imaginamos que essa pessoa pode ser nós mesmos. Um dos melhores conselhos que já ouvi a esse respeito foi do Richard Foster, quando ele disse que era bem pouco saudável ir a uma festa em que te homenageiam. O problema principal seria passar a acreditar em todos os elogios que te fazem. Ninguém, além de Jesus, é Messias ou salvador, muito menos eu mesmo. Farei o que me cabe fazer, com humildade, e isso é suficiente.

2. Não generalize, dê uma segunda chance.


Precisamos aprender a ver as pessoas com outros olhos, os olhos de Deus (1 Sm 16.7b). Às vezes a gente cristaliza uma opinião a respeito de outra pessoa, que no mínimo é injusta, ou também de certa maneira é um desserviço às possibilidades do que Deus ainda quer fazer na vida dessa pessoa. Fazemos isso na família (“ah, esse não tem mais jeito”), ‘determinando’ que tal pessoa é assim e que não há mudança possível. O outro, filho, marido, esposa, genro, acaba acreditando nessa opinião negativa que nós mesmos expressamos ao seu respeito.

Isso também vale em esferas mais amplas. Se é dessa posição ou partido político, é porque é corrupto. Se é dessa ou daquela outra ideologia então é alguém insensível aos menos favorecidos. Se é muçulmano, então seria um terrorista em potencial, e por aí a lista pode seguir bem grande.

Se Deus me estende da sua graça, eu devo estar pronto para estender graça (que em última análise vem de Deus) também aos demais. Isso se expressa dando segundas chances às pessoas. Jesus com a mulher adúltera (Jo 8.11), Paulo, antes perseguidor (At 9), Barnabé e João Marcos (At 15.39), Jesus restaurando a Pedro (Jo 21), são tantas as vezes que esse exercício da paciência e da segunda chance aparecem nas Escrituras! Se dar novas oportunidades às pessoas é o ‘modus operandi’ do Senhor, por que querer tentar ser mais severos que Jesus, buscar ser ‘mais justos que o rei’?

3. Guie-se por princípios, antes que por regras.

Lembram-se das respostas de Jesus quando confrontado com algumas regras (Mt 23.23; Mc 2.27)? Ele não defendia a anomia, uma ausência de regras ou leis para a vida. Mas, sim, apontava sempre ao propósito pelo qual elas haviam sido estabelecidas em um primeiro momento.

Então, quer experimentar vitórias nas resoluções de ano novo? Ponha mais valor nos princípios do que nos detalhes específicos das regras ou metas a que você se propõe. O propósito geral, o princípio por detrás, os valores que nortearam essa resolução, isso tudo é sempre o mais importante. Eles lhe permitirão fazer ajustes nas metas, revisar o que já foi planejado de maneira meio irrealista, ajustar-se, caminhar com mais serenidade.

Às vezes pode ser um processo mais lento, mas será mais seguro, com vitórias e passos concretos, sólidos, que te ajudarão a crescer em algumas áreas, nos sonhos e expectativas a que você se propõe nesse novo ano.

4. Aprenda a esperar, trabalhe enquanto espera.

É preciso aprender a esperar, mesmo quando não temos muitos motivos para ter esperança (Rm 4.18a). Tenho aprendido que saber esperar é uma lição espiritual profunda, mais do que muitas vezes imaginamos. Quem não sabe esperar perde, e perde muito. Esperar os tempos, os processos, ou às vezes só esperar, sem muita promessa ou expectativa, “esperando contra toda a esperança”.

Mas há outro detalhe, não menos importante. Nossa espera deve ser, com frequência, ativa. Fazer o que podemos com aquilo que está ao alcance de nossas mãos. Trabalhar, com a energia e as capacidades que Deus nos dá, fazendo tudo o que podemos ou devemos fazer.

Depois de 45 anos esperando, Calebe recebeu a porção de terra que lhe havia sido prometida pelo Senhor. Mas ainda assim, recebendo-a, pois era o Senhor quem a dava, ele ainda teve que ir, lutar e conquistá-la (Josué 14 e 15).

O Senhor espera de nós que assumamos responsabilidades, que “esperemos ativamente”, que nos esforcemos em tudo que está em nossas mãos e alcance. O resto, devemos deixar nas mãos do Senhor. Esperar assim é muito melhor.

5. Conheça mais a Deus, porque gera vida.


Uma das resoluções mais importantes que você pode fazer para o novo ano é a de buscar conhecer mais a Deus, o que nos leva à vida verdadeira (Jo 17.3). Às vezes, a nossa fé esfria. E uma das razões principais por trás desse esfriamento é a falta de conhecimento do caráter e do coração de Deus. Quando a gente deixa de crescer em conhecer mais de Deus, é natural que nossa fé e vigor espiritual diminuam.

Procurei, mas não achei, um texto que o Cony escreveu há um tempo. Creio que se chamava “Quando Deus acaba”, mas não tenho certeza. Basicamente, parece que às vezes desejamos que Deus seja de uma certa maneira, e daí somos surpreendidos quando encontramos que é diferente. Mas melhor assim, se o que a gente encontra é o Deus verdadeiro. Porque o problema é quando a gente tem tantas ideias erradas a respeito de Deus, que a gente acaba deixando de acreditar que Ele exista. Daí vemos que o ponto principal é: qual é ou como é o Deus em que acreditamos. Ou seja, a questão verdadeira não é se Deus existe ou se alguém crê em Deus. O ponto principal é sobre em que Deus se crê. Se não, um dia, ele “acaba”.

Ter muitas ideias erradas a respeito de Deus tem solução. Temos a sua Palavra, temos a comunidade como espaço hermenêutico para estudá-la. Temos também o lugar onde a gente vive, as relações, a família, a sociedade, como esse espaço para existencialmente experimentar a realidade de Deus, uma fé que conforma a nossa identidade e como vivemos no mundo ao nosso redor.

Uma boa decisão para a ano novo: estudar, ler, meditar, conhecer mais a fundo o caráter, o coração, os propósitos de Deus, para a tua vida, para a vida de todos. Só assim, disse Jesus, desfrutaremos a vida eterna, a vida verdadeira, a vida que vale a pena viver. 

6. Seja agente de reconciliação e paz

Não apenas fomos reconciliados, mas também somos chamados a ser agentes da reconciliação de todas as pessoas e coisas em Cristo Jesus (Cl 1.20; 2 Co 5.17-18). Difícil encontrar melhor decisão do que essa de buscar viver de acordo com os propósitos e o chamado pelo qual fomos criados. Colaborar com Deus então, algo indescritível, um tanto incompreensível, mas um convite real que Deus nos faz.

Observe que o ‘método’ de Deus é um que busca nos incluir nessa tarefa. Muitas vezes pensamos que pouco ou nada podemos fazer. Ainda assim o Senhor nos diz que nele, por ele e através dele, sim, podemos ser agentes de mudança. Talvez primeiro em nós mesmos, em nossa família, em nossas relações, mas sim também em ondas que se ampliam e, sem que a gente saiba bem como, afetando a história de muitos. No pequeno ou no grande, Deus quer nos usar, e devemos estar abertos e sensíveis a como ele nos conduz para participar de seu mover e atuação na história.

Não sei que resoluções para novo ano ou etapas da vida você já fez ou fará, mas sim espero que tome algumas. Podem ser mais gerais ou bem específicas. Não busque implementá-las sozinho, já que precisamos sempre e bastante uns dos outros, de Deus e sua direção, de um sentido renovado que estamos progredindo, sendo pessoas melhores, aprendendo como uma constante, e com humildade para reconhecer que há revisões no caminho e que é necessário voltar a tomar novas resoluções ao final de cada etapa. 

Um feliz 2016!

Fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/recomendacoes-para-2016-2017-2018

January 30, 2016

Vida longa, vida alongada e vida eterna

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Em vez de pedir a Deus vida longa, riqueza ou a morte de seus inimigos, o recém-empossado rei de Israel pediu sabedoria para governar o povo com justiça. Na escala de valores do jovem Salomão, pelo menos para aquele momento, capacidade para servir a Deus e aos homens era mais importante do que vida longa (1Rs 3.4-15).

Afinal, o que é vida longa?

Vida longa é aquela que, a cada dia, consegue empurrar a morte para frente. Mas, no fundo, o que se quer mesmo é a morte da morte, “aquele monstro cujo lábio inferior toca a terra e o superior toca o céu, de modo a engolir tudo”.

A morte é uma intrusa, não foi programada, é a sósia do pecado e, segundo Paulo, é o último -- e o pior -- inimigo do ser humano e da criação de Deus a ser derrotado (1Co 15.26).

Na realidade, enquanto não chegarmos à plenitude da salvação, é mais correto falar em vida alongada do que em vida longa. Há uma pequena diferença entre uma e outra.

A vida alongada tem um preço muito alto. Depende de uma infinidade de médicos e enfermeiras, de produtos farmacêuticos -- quase todos de uso contínuo --, de aparelhos cada vez mais sofisticados, de exames de laboratório, de planos de saúde, de internações hospitalares, de cirurgias e de permanências na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI).

Hoje em dia, o alongamento da vida está sendo questionado tanto pela ciência como pela sociedade, incluindo o próprio paciente e sua família. A Organização Mundial da Saúde (OMS) diz que 90% das mortes -- quase 60 milhões por ano -- “resultam de doenças agudas e incapacitantes e enfermidades crônico-degenerativas que podem evoluir com lento e longo processo de morte, dependendo da doença e das comorbidades envolvidas”. O cardeal Raymundo Damasceno Assis, arcebispo de Aparecida, SP, e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), diz que “a morte não é uma doença para a qual devemos achar cura” e “é necessário que o homem reconheça e aceite a própria realidade e os próprios limites”.

Precisamos tirar o foco da esperança da vida longa e da vida alongada e colocá-la na vida eterna, à qual Jesus se referiu diversas vezes.

Vida eterna não é vida terrestre, nem vida física, nem vida comum. Vida eterna é mais do que vida depois da morte e da ressurreição. Ela pode começar aqui e continuar, sem interrupção, para todo o sempre.

O Evangelho de João garante que quem crê no Filho de Deus como Salvador “tem a vida eterna”. O verbo “ter” está no presente e não no futuro (Jo 3.36). O ex-professor do Seminário Teológico de Dallas J. Walvoord explica que vida eterna “é mais o resultado do que a causa da salvação, mas relaciona-se com a conversão ou a manifestação da vida nova em Cristo”.

É aquela vida “que antegoza e garante a comunhão com Deus na eternidade”.

Jesus explicou a Nicodemos que ele seria pregado numa cruz para que todos os que cressem nele tivessem a vida eterna (Jo 3.15). A continuação destas palavras é o versículo mais traduzido e recitado de toda a Bíblia: “Deus amou o mundo tanto, que deu o seu único Filho, para que todo aquele que nele crer não morra, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16).

Jesus não veio remendar coisa alguma -- ele veio para construir coisas novas e maiores. A vida eterna para quem deseja ter vida longa ou vida alongada -- e não consegue -- é uma delas.

A morte daquele monstro cujo lábio inferior encosta no mais baixo abismo e o superior encosta no mais alto céu, de modo a devorar bebês, recém-nascidos, crianças, adolescentes, adultos e idosos de ambos os gêneros, faz parte da escatologia cristã.

O sumiço da morte está em processo.

Fonte: http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/345/vida-longa-vida-alongada-e-vida-eterna

January 29, 2016

A arte de envelhecer

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- Drauzio Varella

Achei que estava bem na foto. Magro, olhar vivo, rindo com os amigos na praia. Quase não havia cabelos brancos entre os poucos que sobreviviam. Comparada ao homem de hoje, era a fotografia de um jovem.

Tinha 50 anos naquela época, entretanto, idade em que me considerava bem distante da juventude. Se me for dado o privilégio de chegar aos 90 em pleno domínio da razão, é possível que uma imagem de agora me cause impressão semelhante.

O envelhecimento é sombra que nos acompanha desde a concepção: o feto de seis meses é muito mais velho do que o embrião de cinco dias.

Lidar com a inexorabilidade desse processo exige uma habilidade na qual nós somos inigualáveis: a adaptação. Não há animal capaz de criar soluções diante da adversidade como nós, de sobreviver em nichos ecológicos que vão do calor tropical às geleiras do Ártico.

Da mesma forma que ensaiamos os primeiros passos por imitação, temos de aprender a ser adolescentes, adultos e a ficar cada vez mais velhos.

A adolescência é um fenômeno moderno.

Nossos ancestrais passavam da infância à vida adulta sem estágios intermediários. Nas comunidades agrárias o menino de sete anos trabalhava na roça e as meninas cuidavam dos afazeres domésticos antes de chegar a essa idade.

A figura do adolescente que mora com os pais até os 30 anos, sem abrir mão do direito de reclamar da comida à mesa e da camisa mal passada, surgiu nas sociedades industrializadas depois da 2a. Guerra Mundial. Bem mais cedo, nossos avós tinham filhos para criar.

A exaltação da juventude como o período áureo da existência humana é um mito das sociedades ocidentais. Confinar aos jovens a publicidade dos bens de consumo, exaltar a estética, os costumes e os padrões de comportamento característicos dessa faixa etária tem o efeito perverso de insinuar que o declínio começa assim que essa fase se aproxima do fim.

A ideia de envelhecer aflige mulheres e homens modernos, muito mais do que afligia nossos antepassados. Sócrates tomou cicuta aos 70 anos, Cícero foi assassinado aos 63, Matusalém sabe-se lá quantos anos teve, mas seus contemporâneos gregos, romanos ou judeus viviam em média 30 anos. No início do século 20, a expectativa de vida ao nascer nos países da Europa mais desenvolvida não passava dos 40 anos.

A mortalidade infantil era altíssima; epidemias de peste negra, varíola, malária, febre amarela, gripe e tuberculose dizimavam populações inteiras. Nossos ancestrais viveram num mundo devastado por guerras, enfermidades infecciosas, escravidão, dores sem analgesia e a onipresença da mais temível das criaturas.

Que sentido haveria em pensar na velhice quando a probabilidade de morrer jovem era tão alta? Seria como hoje preocupar-nos com a vida aos cem anos de idade, que pouquíssimos conhecerão.

Os que estão vivos agora têm boa chance de passar dos 80. Se assim for, é preciso sabedoria para aceitar que nossos atributos se modificam com o passar dos anos. Que nenhuma cirurgia devolverá aos 60 o rosto que tínhamos aos 18, mas que envelhecer não é sinônimo de decadência física para aqueles que se movimentam, não fumam, comem com parcimônia, exercitam a cognição e continuam atentos às transformações do mundo.

Considerar a vida um vale de lágrimas no qual submergimos de corpo e alma ao deixar a juventude é torná-la experiência medíocre. Julgar, aos 80 anos, que os melhores foram aqueles dos 15 aos 25 é não levar em conta que a memória é editora autoritária, capaz de suprimir por conta própria as experiências traumáticas e relegar ao esquecimento inseguranças, medos, desilusões afetivas, riscos desnecessários e as burradas que fizemos nessa época.

Nada mais ofensivo para o velho do que dizer que ele tem “cabeça de jovem”. É considerá-lo mais inadequado do que o rapaz de 20 anos que se comporta como criança de dez.

Ainda que maldigamos o envelhecimento, é ele que nos traz a aceitação das ambiguidades, das diferenças, do contraditório e abre espaço para uma diversidade de experiências com as quais nem sonhávamos anteriormente.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/drauziovarella/2016/01/1732457-a-arte-de-envelhecer.shtml

January 28, 2016

Sede de Deus

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“A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo. Quando poderei entrar para apresentar-me a Deus?” (Sl 42.2).

- Luiz Fernando dos Santos

Buscar mais a Deus, ter mais sede d’Ele e de seu poder. Deveria ser essa a decisão de todos nós, dentre todas as resoluções justas e possíveis, de todos os pedidos necessários e imprescindíveis para o ano de 2016.

O interesse ‘nas coisas de Deus’ é um dos aspectos mais surpreendentes dos dias de avivamento e despertamento espiritual. Interesse que não se resume à busca de experiências místicas ou sensoriais, mas tem a ver, sobretudo, com um renovado interesse em doutrina, em conhecimento dos atributos de Deus, de seu plano e de como Ele o realizou em Cristo. Interesse por conhecer mais e melhor a pessoa de Jesus, sua natureza, seus ofícios, sua obra consumada na Cruz. Um novo e santo interesse por saber quem é o Espírito Santo e sua relação com as outras duas pessoas divinas da Trindade, qual a sua missão e como Ele atua.

Deste interesse por doutrina, inevitavelmente, aparecem na alma aquela admiração, aquele desassombro, aquele encantamento por Deus que leva ao amor por sua santidade, ao ‘maravilhamento’ com a sua beleza e verdade e, por conseguinte, às mais variadas experiências sensoriais, afetivas, emocionais, psíquicas.

Sim, como cristãos reformados não temos porque temer, duvidar ou rechaçar tais experiências. Elas são bíblicas. Elas apareceram sempre em momentos de grande visitação do Espírito Santo. Sempre que a Palavra de Deus foi pregada com integridade e fidelidade estas manifestações ocorreram. Seja pelo quebrantamento que levou a muitos às lágrimas, ao temor do inferno em forma de desespero – como no ocorrido quando Jonathan Edward pregava seu sermão “Pecadores nas mãos de um Deus irado” –, ou êxtase e delírio santo, visões e sentimentos inefáveis de paz e doçura da alma ao contemplar da beleza, amor, santidade de Deus em Cristo. O que não pode e nem deve ocorrer é a busca da experiência como um fim em si mesma.

Experiência sem doutrina, sem sólido conhecimento, descamba em alienação. Conhecimento sem experiências espirituais se torna fundamentalismo estéril, ortodoxia morta. O conhecimento mais a experiência levam a uma conduta de vida que rejeita o mal e o pecado em si mesmo, os que se originam a partir de si e os presentes no mundo. Conhecimento reto e experiência saudável, atestada pelas Escrituras, produzem um viver agradável a Deus. Ou seja, uma conduta santa e generosa, que em tudo reputa glória a Deus e em tudo busca o bem dos irmãos e a salvação dos incrédulos. Estes elementos, quando encontrados de maneira simétrica no caráter do crente, o faz amar os santos, a sua companhia, as suas palavras e a vida compartilhada com eles.

Quando a igreja alcança este estágio da maturidade cristã ela não suporta pastores despreparados, cultos centrados na vaidade humana, oficiais que não consigam sequer conduzir o culto doméstico ou pastorear a própria família. A igreja produz homens com robustez ética suficiente para atuarem na política. Ilumina as mentes de seus filhos para ingressarem no mundo acadêmico, da educação, das ciências e das artes para reivindicarem ali o senhorio de Cristo. São capazes de reconhecer sem medo que uma verdade, ainda que vinda de um ateu, é sempre verdade de Deus, que não pode mentir.

Assim, a Igreja e os seus membros, com conhecimento sólido, experiência verdadeira do Espírito, vivendo segundo a vontade de Deus, poderão transformar este mundo tornando-o melhor habitável para todos até que volte o Senhor.

Por isso, meu conselho é que em 2016 nós desejemos mais de Deus. Supliquemos ao Espírito Santo que aumente nossa sede de conhecimento bíblico e doutrinário. Que aumente nosso desejo de novas e mais profundas experiências espirituais. Que nos faça mais resolutos em viver para a glória de Deus e a promoção do Reino de Deus no mundo.

Fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/sede-de-deus

January 27, 2016

Alegria

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A prática da alegria é a arte de oferecer resistência à tristeza por meio do contentamento proporcionado pela presença de Deus na vida daquele que O busca e da descoberta e exploração das muitas e variadas minas de alegria que estão à margem do caminho em direção à vida eterna 

- Elben Lenz César

A alegria não é só uma opção de vida. É uma ordem de Deus ao seu povo. Em Cristo, é uma aberração não ser alegre. É um mau testemunho. É uma contra-evangelização. É uma falta de coerência. O mandamento da alegria está espalhado nas Escrituras Sagradas: nos livros da lei (Dt 16.11), nos Salmos (Sl 32.11), nos profetas (Zc 9.9), nos Evangelhos (Lc 10.20), nas Epístolas (Fp 4.4) e no Apocalipse (Ap 19.7).

A Bíblia ensina uma alegria teimosa, aparentemente arrogante, não-artificial, baseada na fé, e não na instabilidade das circunstâncias de tempo e lugar, comprometida mais com a saúde da alma do que com o bem-estar físico. Esse tipo resistente e durável de alegria pode ser visto na famosa oração de Habacuque: “Embora as figueiras tenham sido totalmente destruídas e não haja flores nem frutos; embora as colheitas de azeitonas sejam um fracasso e os campos estejam imprestáveis; embora os rebanhos morram pelos pastos e os currais estejam vazios, eu me alegrarei no Senhor! Ficarei muito feliz no Deus da minha salvação!” (Hc 3.17-18, BV).

É importante lembrar que Paulo estava em um cárcere quando escreveu a Epístola aos Filipenses, na qual enfatiza a prática da alegria: “Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez digo: alegrai-vos” (Fp 4.4). Nessa mesma carta, o apóstolo declara ter aprendido a viver contente em toda e qualquer situação: “Tanto de fartura, como de fome; assim de abundância, como de escassez; tudo posso naquele que me fortalece” (Fp 4.12-13).

Gritos de alegria

A Bíblia descreve o regozijo do povo de Deus no correr dos anos e não economiza palavras para mencionar a intensidade e a qualidade dessa alegria.

Fala-se em grande alegria (Lc 24.52; At 8.8; Fm 7), em alegria completa (Jo 16.24; 1Jo 1.4; 2Jo 12), em abundância de alegria (2Co 8.2), em alegria transbordante (Mt 13.44; At 13.52), em plenitude de alegria (Sl 16.11), em alegria indizível (1Pe 1.8), em alegria eterna (Is 35.10) ou perpétua alegria (Is 51.11), em alegria em extremo (Jn 4.6) e até em gritos de alegria (Sl 42.4). As vozes da alegria provocada pela restauração e dedicação dos muros de Jerusalém na época de Esdras e Neemias foram ouvidas a uma grande distância (Ne 12.43). Salomão descreve a alegria do coração como um banquete contínuo (Pv 15.15). E Jesus faz questão de dizer que a alegria provocada por sua ressurreição seria perene: “A vossa alegria ninguém poderá tirar” (Jo 16.22).

A alegria propicia o louvor: “Está alguém alegre? Cante louvores” (Tg 5.13). O salmo 42 lembra com saudades da multidão em festa por ocasião das procissões à casa de Deus, “entre gritos de alegria e louvor” (v. 4-5). O povo comemorou a renovação da aliança na época do sacerdote Joiada “com alegria e com canto, segundo a instituição de Davi” (2 Cr 23.18). É muito difícil separar a alegria do louvor, o louvor da música e a música da expressão corporal (dança): “Louvai-o [a Deus] ao som da trombeta; louvai-o com saltério e com harpa. Louvai-o com adufes e danças; louvai-o com instrumentos de corda e com flautas, louvai-o com címbalos sonoros. Louvai-o com címbalos retumbantes” (Sl 150.3-5). Momentos de intensa alegria foram descarregados na música e na dança: por Miriã, logo depois da travessia do mar Vermelho (Êx 15.20-21); pela filha de Jefté, logo depois da vitória do pai sobre os filhos de Amom (Jz 11.34); e por Davi, logo depois da recuperação da arca do Senhor (2Sm 6.14-15).

A fonte primeira

Na verdade, a maior fonte de alegria é a presença de Deus na vida diária do homem: “Na tua presença há plenitude de alegria, na tua destra delícias perpetuamente” (Sl 16.11). Daí a oração de Moisés: “Sacia-nos de manhã com a tua benignidade, para que cantemos de júbilo e nos alegremos todos os nossos dias” (Sl 90.14).

Davi e Salomão, pai e filho, confirmam essa verdade. Porque pecou e se retirou da presença de Deus, Davi perdeu a alegria, que lhe era uma experiência comum. É por essa razão que ele pede duas vezes no famoso salmo de confissão e arrependimento o retorno desse estado de espírito: “Faze-me ouvir júbilo e alegria, para que exultem os ossos que esmagaste” e “Restitui-me a alegria da tua salvação” (Sl 51.8, 12). Já Salomão, seu filho, se distanciou de Deus por causa de suas mulheres estrangeiras (1Rs 11.1-8) e peregrinou atrás de alegrias duvidosas e efêmeras, entregando-se sem reserva a todos os seus desejos (Ec 2.10), tendo chegado por fim à feliz conclusão de que, separado de Deus, “quem pode alegrar-se?” (Ec 2.25).

Essa lição foi duramente aprendida tanto por Davi como por Salomão. O primeiro confessou: “O Senhor, tenho-o sempre à minha presença” (Sl 16.8). O segundo escreveu um dos apelos mais convincentes e bonitos das Escrituras contra a frustração e o tédio e a favor da colocação de Deus na linha de frente do pensamento humano: “Lembra-te do teu Criador nos dias da tua mocidade, antes que venham os maus dias, e cheguem os anos dos quais dirás: Não tenho neles prazer” (Ec 12.1).

Quando se fala em alegria na Bíblia, repetidas vezes refere-se à “alegria no Senhor”. Vejam-se os salmos de Davi (9.2; 32.11; 63.11), a oração de Habacuque (Hc 3.18) e a Epístola de Paulo aos Filipenses (Fp 4.4).

Minas de alegria

A alegria não é tão difícil quanto os pessimistas pensam. Ela é provocada por coisas simples sempre relacionadas com a pessoa de Deus. Basta lembrar que a alegria é fruto do Espírito (Gl 5.22), consequência inevitável para quem está em Cristo e anda no Espírito, e não na carne. Essa verdade é reforçada por mais este texto: “Vocês receberam a mensagem com aquela alegria que vem do Espírito Santo, embora tenham sofrido muito” (1Ts 1.6, BLH).

Outra fonte de alegria é a segurança do perdão e da salvação: “Alegrai-vos, não porque os espíritos se vos submetem, e, sim porque o vosso nome está arrolado nos céus” (Lc 10.20).

Todas as vezes que Deus se manifesta e aviva a sua obra no decorrer dos anos e a faz conhecida (Hc 3.2), há muita alegria: “Quando o Senhor restaurar a sorte do seu povo, então exultará Jacó, e Israel se alegrará” (Sl 14.7; 53.6). Talvez seja uma das mais poderosas fontes de alegria do povo de Deus (2Cr 15.15; 29.36; 30.23-27; Ed 6.22; Ne 12.43). O crescimento quantitativo e qualitativo da igreja primitiva foi celebrado com muita alegria (At 15.3), justificando o provérbio de Salomão: “Quando se multiplicam os justos, o povo se alegra, quando, porém, domina o perverso, o povo suspira” (Pv 29.2).

O fruto do penoso trabalho também é fonte de alegria, até para Jesus: “Ele verá o fruto do penoso trabalho de sua alma e ficará satisfeito” (Is 53.11). Paulo correu risco de vida em Tessalônica (At 17.1-10), mas muito se alegrou com os resultados de seu trabalho naquela cidade e escreveu aos tessalonicenses:

“Vós sois realmente a nossa glória e a nossa alegria!” (1 Ts 2.20). Na pequena epístola dirigida a Gaio, João se abre: “Não tenho maior alegria do que esta, a de ouvir que meus filhos [na fé] andam na verdade” (3Jo 4).

As promessas de Deus são outra verdadeira fonte de alegria: “Alegro-me nas tuas promessas, como quem acha grandes despojos” (Sl 119.162). A esperança produz alegria antecipada e diminui sensivelmente o impacto da dor, como aconteceu com Paulo: “Para mim tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não são para comparar com a glória por vir a ser revelada em nós” (Rm 8.18). Os heróis da fé listados na Epístola aos Hebreus não obtiveram em vida a concretização da promessa, mas viveram debaixo da alegria e do entusiasmo daquilo que Deus prometeu fazer a seu tempo (Hb 11.39-40). Entre Zacarias e o nascimento de Jesus, há pelo menos cinco séculos, mas o profeta anunciou à sua geração: “Alegra-te muito, ó filha de Sião; exulta, ó filha de Jerusalém: eis aí te vem o teu Rei, justo e salvador, humilde, montado em jumento, num jumentinho, cria de jumenta” (Zc 9.9). 

Enquanto entre os secularizados a alegria depende do ter, e não do ser, do receber, e não do dar, entre os cristãos um dos segredos da alegria é a ordem inversa: “Mais bem-aventurado é dar que receber” (At 20.35). Essa palavra atribuída a Jesus é comprovada na experiência do povo de Deus tanto na época da construção do primeiro templo (1Cr 29.9) como na época da restauração da casa do Senhor, cerca de 150 anos depois (2Cr 24.10). Em ambos os textos, se lê que o povo se alegrou por ter dado liberalmente a sua contribuição voluntária.

Tempos de alegria

Por causa do pecado, por causa da depravação humana, por causa da ordem política e social injusta, por causa da incredulidade, por causa da atuação satânica, por causa do orgulho humano, por causa da fome e da miséria, por causa da enfermidade e da morte, por causa da rejeição do evangelho e por causa dos erros cometidos pela liderança civil e religiosa – nem todo tempo é tempo de alegria. A Bíblia ressalta esta verdade: “[Há] tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de saltar de alegria” (Ec 3.4).

O próprio Jesus, a fonte de toda a alegria, teve momentos de tristeza. Ele chegou a chorar ao ver Maria, irmã de Lázaro, em prantos por causa da morte do irmão (Jo 11.33-35). Chorou outra vez, na entrada triunfal em Jerusalém, ao ver, do alto do Monte das Oliveiras, a cidade impenitente e marcada para a completa ruína (Lc 19.41-44). A sua maior tristeza, porém, foi no jardim do Getsêmani, quando buscou a simpatia de Pedro, Tiago e João: “A minha alma está profundamente triste até à morte; ficai aqui e vigiai comigo” (Mt 26.38).

Em certas situações muito especiais, a tristeza torna-se virtude e a alegria torna-se pecado. Paulo se mostra virtuoso ao se preocupar com a incredulidade dos judeus, a despeito de todas as prerrogativas do povo eleito, seus irmãos e compatriotas segundo a carne: “Tenho grande tristeza e incessante dor no coração” (Rm 9.1-5). Jó também se mostra virtuoso porque não se alegrou com a desgraça daquele que lhe devotava ódio (Jó 31.29). Aliás, está escrito que “o que se alegra da calamidade não ficará impune” (Pv 17.5). Existem o “Alegra-te” (Zc 9.9) e o “Não te alegres” (Os 9.1). O “alegra-te” é para as coisas que Deus faz (Sl 118.24), e o “não te alegres” é para as coisas que o homem faz de errado (Tg 4.9).

A tristeza tem de ser bem dosada. Tem de ser passageira. Tem de ser usada por Deus para provocar humildade, arrependimento e mudança de comportamento (2Co 7.10). Tem de ser resolvida pela consolação das Escrituras (Rm 15.4) e pela consolação do Espírito (Jo 14.16). Tem de ser amenizada pela esperança cristã (1Ts 4.18). Tem de ser sucedida pela alegria, como se preconiza neste salmo: “Ao anoitecer, pode vir o choro, mas a alegria vem pela manhã” (Sl 30.5). Tem de ser positiva como as dores da mulher que está para dar à luz, prontamente aliviadas ao nascer a criança (Jo 16.21-22). Tem de ser vencida e subjugada pela alegria do Senhor. Para tanto, é necessário recorrer a Deus: “Alegra-nos por tantos dias quantos nos tens afligido, por tantos anos quantos suportamos a adversidade” (Sl 90.15).

Fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/pratica-da-alegria

January 21, 2016

O joio e o trigo

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Um dos mais elucidativos e oportunos ensinos de Jesus é o da parábola do joio no meio do trigo (Mt 13.24-30, 36-43). Além de fornecer diretrizes prudentes e acertadas, a famosa parábola acalma o coração daqueles que estão à beira de um colapso por causa da realidade e da ousadia do princípio do mal.

A descrição que William Hendriksen faz daquele que semeou o joio no campo já semeado de trigo é muito pertinente: “O que esse inimigo faz é mesquinho, cruel, covarde, sádico. Ele espera até que todos estejam em profundo sono, para não ser visto e apanhado em flagrante. Então, sem o menor laivo de consideração por todo o trabalho despendido na lavoura, os gastos incorridos e as esperanças alentadas, ele semeia novamente a lavoura, mas agora com joio”.1

A mensagem de Caio Fábio d’Araújo Filho sobre esta parábola, também é muito apropriada, a começar pelo título: “O silêncio do trigo e a zoada do joio”.2 Vale a pena transcrever algumas frases:

“É impressionante como o mundo está cheio de trigo, embora seja o joio quem dá as cartas na história.”

O trigo existe em abundância, mas é discreto, sem voz alta, sem projeto de ser nada além do pão, sem ambição além do chão, sem pretensão de viver sem antes morrer. O joio, entretanto, tem o chão, tem a imagem do trigo, mas não dá fruto nem se torna pão. Por isto, tendo o mesmo chão, tendo a mesma imagem, mas não se tornando chão, o joio não quer morrer, ambicionando existir como clone daquele que dá fruto: o trigo.”

“A questão não é fazer o joio acabar (esse trabalho, segundo Jesus, será dos anjos) -- mas ajudar o trigo a não temer morrer, e, assim, dar muito, muito fruto.”

O joio continuará tentando substituir o amor pelo poder, a bondade pessoal por instituições de ajuda, boa vontade por engajamento político, misericórdia por militância ideológica, amor ao próximo por serviço religioso, adoração a Deus por “show” musical, pregação da Palavra por sedução mágica, e tudo o mais que o joio se especializou a praticar como estelionato contra a verdade, o amor e a genuína fé.”

A história não deixa dúvida: o joio penetra também nos campos onde o trigo do avivamento é semeado.

Na esteira dos avivamentos religiosos há sempre alguma coisa espúria, que empobrece e desvirtua o movimento, embora não o impeça nem o danifique por completo.

O historiador Williston Walker lembra que, no clima emocional do início do século 19, insuflado por despertamentos religiosos, surgiram também “vários movimentos que representam significativos afastamentos ou distorções do modelo protestante evangélico”.3 Alguns deles só se mostraram nocivos vários anos depois. Hoje são grupos fortes e numerosos espalhados pela face da terra, como as Testemunhas de Jeová e os Mórmons.

Quando esteve no Brasil, em 1952, o avivalista e historiador J. Edwin Orr declarou que para cada grande avivamento da história há uma reação contrária, desde John Wycliffe (1329-1384) até Billy Graham.

Outro historiador, Mark A. Noll, professor de pensamento cristão do Wheaton College, no estado americano de Illinois, explica que o ambiente propício ao avivamento (religiosidade intensa, mais liberdade individual etc) foi também propício à fragmentação do evangelicalismo nas gerações posteriores a 1830.4

Em 1742, oito anos depois do início do Primeiro Grande Avivamento, Jonathan Edwards já advertia o povo do perigo das distorções, mostrando a necessidade de discernir as verdadeiras marcas do arrependimento e a nova vida em Cristo. Nessa ocasião, escreveu “Thoughts on the Revival in New England” (Reflexões sobre o reavivamento na Nova Inglaterra). Quatro anos depois, escreveu “Uma Fé Mais Forte que as Emoções”, “um dos livros mais importantes de todos os tempos”, na opinião de James M. Houston.

Um dos maiores riscos em um avivamento é quando o ponto de partida, a propaganda, a atração e a própria sobrevivência dele dependem mais das emoções do que da sustentação das Escrituras Sagradas e da operação do Espírito Santo. O problema é tão antigo quanto atual. Em 1801, num grande encontro realizado em Cane Ridge, em Kentucky, o pastor presbiteriano Barton Stone já ensinava o “exercício da queda” (quando alguém dá um grande grito e cai ao chão), o “exercício do ladrido” (quando alguém emite um grunhido ou late como um cachorro), o “exercício do riso” (quando alguém solta uma gargalhada muito alta e sem razão), o “exercício da corrida” (quando alguém sai em disparada para outro lugar sob a pressão do medo) etc.5 Coisas excêntricas desse tipo jamais podem ser atribuídas ao Espírito.

A emoção não é pecaminosa nem desnecessária. É uma reação natural frente ao prazer e ao desprazer.

A vida cristã é uma fonte de emoções. Há uma grande porção de experiências religiosas que provocam fortes emoções: a descoberta de Deus, a aceitação do evangelho, o perdão dos pecados, a prática da comunhão com Deus e com os irmãos, a vitória sobre o pecado, a oração respondida, a leitura devocional da Bíblia, o fruto do Espírito (amor, alegria, paz, amabilidade, domínio próprio), o derramar de alguma tristeza ou dor diante de Deus em oração etc. O verdadeiro cristão não é insensível. Ele vibra, se alegra e também chora. O próprio Jonathan Edwards procurava incentivar o que chamava de “afetos”, isto é, “aquilo que tira a pessoa da neutralidade ou mero assentimento [da verdade] e inclina seu coração a possuir ou rejeitar algo”.

Todavia, o crente não deve ser movido a emoções, porque muitas vezes elas falham. São circunstanciais. Com frequência dependem de um belo dia, de um bom estado de saúde, de companhia, de boas notícias.

Ele precisa depender da autoridade da Palavra de Deus. Se as emoções falham, a Palavra não falha, pois quem faz as promessas é “o Deus que não pode mentir” (Tt 1.2). O crente cuja fé não é mais forte que as emoções é volúvel, instável e vítima de arroubos e depressões intercaladas entre si.

O famoso trinômio “fato, fé e emoções”, do pastor londrino Frederick B. Meyer (1847-1929), vem a calhar.

 Esta é a ordem certa: primeiro o “fato” (o que a Bíblia diz), depois a “fé” (a apropriação do que a Bíblia diz) e, por último, as “emoções” (consequência natural, imediata ou posterior, leve ou intensa, do que se crer).

Colocar o sentir antes do crer nas promessas de Deus é o mesmo que tentar construir o último andar de um edifício sem ter nem sequer lançado os alicerces.

Um ambiente carregado de emoções, geradas pela própria pessoa ou por um líder carismático que faz questão de “demonstrar que tem magnetismo pessoal irresistível, atitudes e aparência de vencedor”, pode ser uma cilada emocional.

Notas
1. Mateus, v. 2, p. 86.
2. www.caiofabio.com.
3. “História da Igreja Cristã”, v. 2, p. 279.
4. “The Old Religion in the New World”, p. 100.
5. “História do Cristianismo”, p. 527.

Fonte:  http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/317/o-joio-nos-campos-onde-o-trigo-do-avivamento-e-semeado

January 20, 2016

Será que quem vive de verdade se contenta com simulacro?

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O MUNDO DIGITAL É KITSCH

- Luli Radfahrer

Já faz algum tempo que a ideia publicitária de "experiência" sucedeu a concepção de qualidade nas matérias-primas, produtos e serviços. O consumidor ávido por design quer novos gadgets, jogos, cosméticos, viagens e cirurgias estéticas o tempo todo. Se não durarem, paciência.

Para se manterem desejadas e renovadas, as marcas buscam criar novos estilos com uma velocidade inspirada no mundo da moda. Hoje não basta mais lançar produtos de qualidade técnica. É preciso ser "tendência", lançar regularmente novas linhas – e apresentá-las como coleções.

Isso demanda um novo tipo de consumidor. Egocêntrico e individualista, ele deve privilegiar a originalidade e o divertimento acima de qualquer justificativa técnica, patrimonial ou essencial. Muitos acreditam manifestar, dessa forma, sua independência. Mas a liberdade é parecida com a de um pós-adolescente, que mesmo sem as responsabilidades ou as preocupações do adulto, demanda ser tratado como tal.

As vontades dos novos reizinhos estão refletidas em suas atitudes. O antigo ideal de salário e carreira foi substituído pelo desejo de se exprimir, criar, fazer coisas estimulantes que a atividade profissional não permite. Um número cada vez maior de artistas autointitulados quer exercer uma atividade criativa paralela a seu trabalho, consciente de que a celebridade a atingir por meio dela é muito mais importante e necessária para sua autoafirmação do que qualquer habilidade ou talento que demonstre no conjunto da obra.

A nova ordem cultural em um ambiente de muitas estrelas para pouca plateia é dominada pela lógica do espetáculo e do excesso, e marcada pela mistura de gêneros e interpretações. O conteúdo é consumido sob demanda, e no processo transforma seus espectadores em editores. A fabricação e a difusão de imagens é hoje direito e dever de cada um, sujeita à personalidade que pretende ver identificada e admirada pelos outros.

Essa forma de narcisismo de massa também se reflete na seleção do que é considerado valioso. O gosto pessoal, manifestação de cultura e erudição, se tornou mais importante do que qualquer hierarquia, a ponto de toda classificação "oficial" estar sujeita a provas e contestação de seu mérito.

Quando todas as opiniões se tornam legítimas, nenhum critério pode ser considerado definitivo. Sem referências, cada um escolhe e manifesta a sua opinião sobre o que considera familiar.

É o ambiente perfeito para a proliferação do "kitsch". O termo, derivado do alemão, surgiu para classificar objetos que imitam a arte mas são produzidos em massa, na tentativa de se apropriar de símbolos populares. Surgido como uma proposta artística fácil, cheia de sentimentalismo e melodrama, ele não tem as complicadas demandas culturais da arte clássica ou contemporânea.

Enquanto as vanguardas tentam replicar os processos artísticos, o "kitsch" se limita a copiar seus efeitos. Sua interpretação precisa ser fácil, inequívoca, imediata. A gratificação, instantânea. O esforço intelectual, inexistente. Seu objetivo é o de entreter, decorar sem incomodar. É arte de resultados, cujo propósito é tão evidente quanto peças de propaganda ideológica.

Ao se apropriar e simplificar as emoções, boa parte do mundo publicitário é "kitsch" na sua tentativa de quantificar, formular e comercializar as relações humanas. Em sua realidade simulada, a propaganda usa truques e narrativas para extrair o que há de espontâneo, empacotá-lo e, como em um suco industrializado, entregar uma versão aguada e artificial, plástica e insossa.

Cultura da negação, o "kitsch" é uma boa forma para que marcas desprovidas de qualquer diferencial criem uma cumplicidade com seus consumidores igualmente medíocres. Ao diminuir o valor da cultura, elas massageiam seus egos e removem deles a busca por algo melhor. Seu oposto não é a sofisticação, mas a inocência.

O poder adora o "kitsch". Em guerras e manifestações religiosas ele impera. Praticamente não há ditador que não o coloque a serviço do estado, pronto para glorificá-lo e alimentar o culto à personalidade. As imagens de fábricas produtivas e trabalhadores gordinhos e felizes representam o anti-Portinari idolatrado por qualquer governo, principalmente quando, como fazia Collor e hoje faz Putin, coloca o chefão acima das forças da natureza.

No mundo "kitsch" das redes sociais todos são reizinhos. E procuram de seus públicos uma aceitação simples, direta, sem maiores questionamentos a que não serão capazes de responder. Não há canal melhor para isso do que a falsificação da arte do Instagram, do currículo no LinkedIn, da ironia no Twitter, do humor no YouTube, da vida no Facebook. Na forma de meme, o "kitsch" digital é facilmente compreendido, compartilhado e... esquecido.

Arte de conveniência, produzida por linhas de montagem, o "kitsch" é entretenimento em sua essência. Seu objetivo é fazer rir, não se levar a sério, evitar a ambição cultural. Travestido de paródia, ele é vista em relógios do Mickey, em quadros do Romero Britto, em fotografias de David LaChapelle e neste ano será celebrada por Hollywood, em um filme com a Emma Watson.

Peças "kitsch" contemporâneas, como as que as precederam, são carregadas de clichês, versões gastas e surradas de ideias que, como "Guerra nas Estrelas", um dia foram originais. Mais do que imitar a realidade, elas convidam o espectador a participar, cúmplice, da farsa que perpetuam. Um anão de jardim ou um pinguim de geladeira dentro de casa são manifestações descartáveis de autonomia subjetiva, piscadelas com irreverência lúdica.

Enquanto a cultura clássica tinha a ambição de formar o indivíduo e ampliar sua percepção de mundo, hoje pede-se à cultura pop que "esvazie a cabeça" de um cotidiano tão carregado de estímulos e demandas. O "kitsch", ao piratear a inteligência, cultiva a insensibilidade. Suas peças substituem a experiência por charadas fáceis, típicas de séries de TV, e transformam a vida em uma liquidação de sensações.

É a manifestação cultural perfeita para os geeks, dândis contemporâneos, imitações baratas de Jay Gatsby, Rhett Butler ou do conde Drácula. Ou, pior, imitações das imitações de Patrick Bateman ou Lucius Malfoy, eles dão maior importância para as gírias, os objetos e os hobbies de seus pares do que para sua verdadeira essência. Desesperados para imitar o conhecimento, mas sem a paciência necessária para adquiri-lo, eles transformam a falsificação estética em culto, congratulando-se em sua esperteza ao parecerem tão fúteis.

Uma das principais funções da arte sempre foi a de buscar a transcendência. Quando genuína, ela estimula seus admiradores a decifrá-la e, no processo, a se tornarem pessoas melhores. O "kitsch", ditatorial ou religioso, editorial ou publicitário, não ter intenção maior além da peça que mostra. É o fast-food da arte, embalado em cores vivas e açucarado com replicações fáceis. Sua intenção é promover reflexos infantis enquanto escraviza seus consumidores aos valores do sistema que perpetua.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/luliradfahrer/2016/01/1730897-o-mundo-digital-e-kitsch.shtml

January 19, 2016

A sociedade do espetáculo

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- João Pereira Coutinho

1) Anos atrás, a revista "Rolling Stone" fez uma capa com Dzhokhar Tsarnaev. Quem? Entendo, leitor: a memória é curta, a orgia das notícias é longa. Digamos apenas que Dzhokhar e seu irmão Tamerlan foram responsáveis pela carnificina na maratona de Boston, onde centenas de pessoas morreram ou ficaram estropiadas. Com uma pose de estrela do rock, Dzhokhar surgia na capa como se fosse o novo ídolo dos palcos. E a "Rolling Stone", que sempre teve fama de "transgressiva" (o supremo adjetivo brega), cruzava a linha mínima da decência.

Velhos hábitos não morrem depressa.

E a mesma "Rolling Stone" decidiu publicar agora matéria longa sobre o encontro entre Sean Penn e Joaquín "El Chapo" Guzmán, o maior narcotraficante do mundo. Como escreve o próprio Sean Penn na introdução à entrevista, "El Chapo" fornece metade das drogas que os EUA consomem. Lemos essas linhas e imaginamos Sean Penn, tomado por excitação adolescente, a babar de admiração pelo feito olímpico.

Mas há pior: para que não restem dúvidas, "El Chapo" é, aos olhos de Penn, a parte mais inocente da história. Para começar, o ator inicia o artigo com uma comparação pungente entre as biografias de ambos: ele, Penn, nascido em família de classe média e surfando as ondas da Califórnia na juventude; Joaquín, pelo contrário, nascido na pobreza e "obrigado" a cultivar droga desde tenra idade. De resto, e em matéria de violência, "El Chapo" é um "empresário", que só recorre ao homicídio em último recurso, diz-nos Penn (vai em paz, Joaquín, e que Deus te abençoe). Porque a violência, a verdadeira violência, está nos Estados Unidos, que continuam a consumir. Se não houvesse consumo, imagino que "El Chapo" estaria no Tibete, dedicado à meditação e ao amor pleno. Depois dessa introdução, a entrevista segue pelo mesmo caminho: ali temos um homem que nasceu pobre; que ama a família; que não deseja mal a ninguém. Sean Penn prometia entrevistar um narcotraficante. Encontrou um quase santo à espera da canonização oficial. E a única coisa a lamentar é a polícia ter localizado "El Chapo" - segundo dizem, por causa da entrevista - e o ter enjaulado novamente.

Vem nos livros: não há santos sem martírio.

A entrevista de "El Chapo" não mostra apenas o apodrecimento da cabeça de Sean Penn (o que seria rotineiro); mostra, coisa pior, o apodrecimento do jornalismo, que não é capaz de estabelecer uma diferença entre a criminalidade e a justiça, a mentira e a verdade.

Aliás, não apenas do jornalismo: depois da captura de "El Chapo", parece que houve forte procura das mesmas camisetas que o narcotraficante usou na entrevista. Também faz sentido: depois do martírio e da santidade, só faltam as relíquias.
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2) Todos os dias, passo pela banca dos jornais e encontro mais uma "celebridade" que informa o mundo sobre a sua doença. Depois, para que não restem dúvidas, a "celebridade" partilha uma foto - rosto cadavérico, ausência de pilosidade por causa dos tratamentos. Nos meses seguintes, a imprensa especializada vai seguindo o enfermo até a recuperação total - ou à destruição final.

A ideia de que a doença e a morte, como o sexo e o amor, são assuntos privados, eis um pensamento anacrônico que se perdeu na "tirania da transparência" em que vivemos.

Tudo é público quando existe um público.

Não me admira que a morte de David Bowie - um dos meus últimos heróis - tenha abismado os abutres.

Como foi possível guardar segredo sobre um câncer? Depois do espanto, veio uma explicação que se ajusta à sociedade do espetáculo: a morte de Bowie foi uma obra-prima, dias depois do lançamento de "Blackstar", o premonitório álbum.

Cada um acredita no que quiser.

Eu prefiro ler o artigo do "Daily Telegraph", no qual Robert Fox, produtor do musical "Lazarus" e amigo de Bowie há mais de 40 anos, conta como foram os últimos meses do artista. A palavra é só uma: banais.

Bowie comunicou-lhe que estava doente. Pediu-lhe sigilo por causa dos "paparazzi" e para proteger a família. E sempre acreditou, mesmo quando preparava "Lazarus", que talvez pudesse sobreviver. Quando a ilusão se desfez, David Bowie preferiu o recato. Bem sei que isso incomoda os comedores de lixo que rastejam por revistas, jornais ou redes sociais.

Mas a atitude de Bowie, nos velhos tempos, chamava-se apenas dignidade.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/joaopereiracoutinho/2016/01/1730951-a-sociedade-do-espetaculo.shtml

January 17, 2016

Ubuntu


Ubuntu exprime a crença na comunhão que conecta toda a humanidade: "sou o que sou, graças ao que somos todos nós"

Uma pessoa com ubuntu está aberta e disponível para as outras, apoia as outras, não se sente ameaçada quando outras pessoas são capazes e boas, com base em uma autoconfiança que vem do conhecimento de que ele ou ela pertence a algo maior que é diminuído quando outras pessoas são humilhadas ou diminuídas, quando são torturadas ou oprimidas.

No contexto africano, isto sugere que o indivíduo se caracteriza pela humanidade com seus semelhantes e respeito aos ancestrais.

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ubuntu_%28filosofia%29
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January 12, 2016

Excelência

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Aretê (do grego ἀρετή aretê,ês, "adaptação perfeita, excelência, virtude") é uma palavra de origem grega que expressa o conceito grego de excelência, ligado à noção de cumprimento do propósito ou da função a que o indivíduo se destina.[1]

No sentido grego, a virtude coincide com a realização da própria essência, e portanto a noção se estende a todos os seres vivos.

Segundo Sócrates, a virtude é fazer aquilo que a que cada um se destina. Aquilo que no plano objetivo é a realização da própria essência, no plano subjetivo coincide com a própria felicidade.

Na Grécia Antiga, aretê significava também a coragem e a força de enfrentar todas as adversidades, e era uma virtude a que todos aspiravam.

Em torno do século IV a.C., aretê passou a incorporar outros atributos, como dikaiosyne (justiça), e sophrosyne (moderação e autocontrole).

Platão incorporou esses novos significados tentando estabelecer uma nova definição para aretê, Aristóteles ampliou seu trabalho e o conceito teve importantes repercussões no pensamento cristão.

Aretê foi também importante elemento na paideia grega, o conceito de educação integral para a formação de um cidadão virtuoso e capaz de desempenhar qualquer função na sociedade.

O treinamento na aretê envolvia educação física, oratória, retórica, ciência, música e filosofia, além de educação espiritual.

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Aret%C3%AA

PS- Para ouvir a trilha do dia, vai lá: https://www.youtube.com/watch?v=Ymlfhf7ctLM
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January 11, 2016

O tempo

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" Dou-lhe este relógio; não para que você se lembre do tempo, mas para que possa esquecê-lo por um momento de vez em quando e não gaste todo o seu fôlego tentando conquistá-lo ".

William Faulkner
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January 10, 2016

Presença, atenção e cuidado

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- Rubem Amorese

Ano passado foram muitas as notas de falecimento de galãs e divas de TV da velha guarda. Na internet, o nome da Marília Pera estava entre os trending topics do twitter: “A arte chora”. E a mídia agrava as perdas com depoimentos, retrospectivas e até cobertura jornalística do funeral.

Um detalhe que me chamou a atenção é uma expressão repetida por alguns famosos ao referirem a alguns como “presente, atento e cuidadoso”.

Notei que essa expressão usada no meio artístico qualificava uma pessoa que estabelecia laços, coisa talvez mais difícil naquele meio. Ainda mais na vida corrida de hoje.

Imagino que um artista deva se movimentar mais que uma borboleta. Mas alguns, ao falecer, recebem o reconhecimento da “presença”, da “atenção” e do “cuidado”.

Gente que conseguiu estar ali quando ali estava; conseguiu ter olhos do coração para quem estava à sua volta; e, pasmem, conseguiu cuidar dos seus colegas.

Na profundidade e intimidade possíveis.

Isso não é curioso?

Numa das matérias, o Tarcísio Meira fez aquela boca torta, olhou para dentro da câmera — eu cheguei a me afastar, pensando que estava olhando dentro dos meus olhos — e disse: fulano “era presente, atento e cuidadoso”.

E eu não pude evitar de pensar: “é Deus falando comigo” (eu sei, tem horas em que exagero nas “leituras devocionais” dos fatos corriqueiros da vida).

Ouvi-O dizer: “aí está um alvo para a sua maturidade”.

E imediatamente respondi: “sim, eu também quero isso pra mim; amém”.

Que problema eu arrumei! Como?!

Como é ser presente, atento e cuidadoso? 

Estar presente já ajuda, mas não resolve totalmente.

Os ausentes sempre falam de “qualidade”. Em geral, sobre o tempo que dedicam aos filhos e cônjuges.

Mas presença é mais que estar perto. Lembro-me de uma professora que, depois da chamada, perguntava: “quem de vocês está aqui?”

Aí, entra a segunda perna do tripé: atenção.

Sim, presença com atenção me parece um bom caminho. E o banquinho vai parar em pé com a terceira perna: o cuidado de quem cuida. Sem terceirizações, “corbãs” ou transferências.

Quem almeja esse tripé, excelente coisa almeja.

Imagine a glória para um pai, uma mãe, um avô, um cônjuge ou um pastor, ser lembrado nestes termos: “sempre foi presente, atento e cuidadoso”?

Faço desse tripé meu voto para 2016, com a ajuda de Deus.

Fonte:http://ultimato.com.br/sites/amorese/2016/01/01/presenca-atencao-e-cuidado/
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January 09, 2016

Gratidão é a memória do coração

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Quando tudo está fora do lugar

- Elsie Gilbert

Eu já elegi minhas prioridades, as minhas “pedras grandes” estão no lugar. Posso dizer honestamente que procuro o reino de Deus e a sua justiça no meu dia a dia.

Mas todo o resto está completamente fora do lugar.

Comecei a minha vida adulta com um tema que perdurou os primeiros 7 anos de meu casamento: mudança. Mudamos 9 vezes neste período - numa delas, perdemos praticamente todos os nossos documentos (uma pasta inteira foi deixada para trás no banco de uma parada).

Não há nada mais desconcertante que viver numa situação em que tudo está fora do lugar, do talão de cheque à pasta de dente - socorro!

Vivo assim nestes dias

Estou no meio de uma mudança que já completa 2 meses e ainda não entrei na casa onde vou habitar. Escrevo este post do estacionamento, dentro de um carro, aproveitando a internet do prédio ao lado. Minha família está dividida em 3 países diferentes: o filho mais velho na Inglaterra, o segundo no Brasil e o restante da família aqui nos EUA, tentando ajudar a minha sogra que está doente.

No meio desta bagunça, pergunto ao meu Senhor: o que se deve fazer quando tudo está fora do lugar?

A 1a. resposta que ele me deu: pratique a gratidão!

A lista de razões pelas quais eu devo estar grata a Deus é tão grande que é melhor eu não começar a enumerá-las aqui.

Este exercício diário me dá a serenidade e o equilíbrio para navegar estes dias caóticos.

Uma coisa é certa, o fato de eu ter perdido momentaneamente algo precioso faz com que eu perceba aquilo que via de regra é meu para desfrutar. No momento consigo ver, mais do que nunca, o valor da estabilidade.

E quantas crianças e adolescentes crescem e vivem no meio do caos?

Talvez seja justamente este o nosso chamado no trabalho social: ajudar as pessoas a encontrarem uma estabilidade possível e nos momentos de caos aprenderem a dar graças a Deus pela sua companhia, pela sua provisão, pelo fato de que Ele nunca nos abandona.

A Deus toda a glória : ).

Fonte: http://ultimato.com.br/sites/maosdadas/tag/gratidao/

January 08, 2016

Entrega

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Um pequeno bebê se encaixa nos braços do pai enquanto a viagem de ônibus segue. 

De fato, a criança dorme tão tranquilamente que me pergunto se há outra maneira de ser feliz.

Neste exato momento, me imagino no lugar dele, e descubro que é isso que a gente procura pela vida toda: a certeza de ser acolhido por quem você confia totalmente

Uma sensação de entrega plena — não sacrificial, mas apenas natural, consequente.

Quando ficamos mais velhos, vamos descobrindo que aqueles que pensávamos perfeitos, não são, e então nos tornamos reticentes em confiar. 

A experiência de entrega se torna mais rara, e decidimos buscá-la ainda em todas as outras fontes aparentemente legítimas. 

E não achamos.

Em Cristo revisito minha fé e enxergo Deus - tanto no menino que se entrega quanto no Pai que o acolhe

Isso é fantástico. 

É revelação.

O Deus que resolveu se revelar como menino, não deixou de ser Deus. 

Vimos no Unigênito sua face como a glória do Pai. 

Nele, encontramos a segurança divina, enquanto nos vemos em sua fragilidade humana. 

E somos acolhidos de toda forma necessária.

Fonte: http://ultimato.com.br/sites/fatosecorrelatos/2015/12/24/entrega/
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PS- Para ouvir a trilha do dia, vai lá: https://www.youtube.com/watch?v=wOzj2OI_KPU

January 07, 2016

Sem segredos

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- Suzana Herculano-Houzel

Você contaria seu maior segredo a um perfeito estranho?

Pois nos últimos anos, mais de meio milhão de pessoas desconhecidas contaram seus segredos ao americano Frank Warren – e usando cartões postais.

Segredos de amor: "Sou apaixonado pela mesma pessoa desde meus 11 anos, mas ela não sabe". De desabafo: "Eu sobrevivi a abusos, a violência, a morar na rua. Mas a anorexia está acabando comigo".

A ocupação inusitada de Frank começou como um projeto artístico, com cartões postais feitos à mão pelo próprio, endereçados a ele e distribuídos pelas ruas de Washington, DC.

Para sua surpresa, o projeto transcendeu a arte e assumiu vida própria, conforme cada vez mais pessoas descobriam o endereço de Frank e lhe enviavam seus próprios postais, feitos e decorados por elas.

O que torna ainda mais improvável que tantas pessoas escolham enviar seus segredos a um desconhecido pelo correio é que o destino dos segredos enviados a Frank é a internet: ainda que anônimos, os segredos são publicados diariamente no site PostSecret.com.

Frank lê todas as várias dezenas de postais que recebe por dia, seleciona alguns, e posta suas mensagens no site.

Para a neurociência, no entanto, faz todo sentido: poder contar um segredo de maneira segura, e mesmo vê-lo tornar-se público, é um alívio.

O problema é que suprimir frases ou pensamentos, e na verdade qualquer ação (como xingar a mãe alheia), requer esforço cognitivo consciente.

Sentar em cima do impulso e contê-lo é possível graças ao córtex pré-frontal que, ao julgar a intenção inadequada ou o segredo impublicável, consegue impedir que se passe à ação.

Mas isso exige atenção constante.

Imagine o esforço de passar um dia inteiro sem poder falar as palavras "Sim", "Não", "Branco" e "Preto", como no jogo que Asterix, na história em quadrinhos, propõe aos gladiadores romanos.

Suprimir segredos é ainda pior: são fatos, desejos, memórias, pensamentos que fazem parte de nossa essência, que nos acompanham ao longo dos dias, mas que o córtex pré-frontal decreta incomunicáveis.

Não poder falar de algo que nos consome é mentalmente exaustivo.

Mas poder contar um segredo – ah, o alívio de contá-lo, poder deixar o córtex motor seguir adiante e soltar todas aquelas frases ensaiadas tantas vezes, mas sempre contidas, e finalmente mudar de assunto.

E o melhor de tudo?

Frank lê segredos – mas não julga o dono.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/suzanaherculanohouzel/2016/01/1725907-sem-segredos.shtml  
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January 06, 2016

Tenho vocação para a tristeza, mas acredito demais na alegria

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Nós hoje tendemos a focalizar só os fatos. Com isso, perdemos de vista a vida que, sendo o nosso maior bem, é efêmera.

- Betty Milan

Não sei quem é o autor desta frase que eu escrevi e atribuí ao personagem João no romance O Clarão. Ana, a heroína do romance, vê um palhaço que se equilibra sobre duas pernas de pau enquanto um menino brinca de puxar a perna da calça dele. Ninguém passa sem rir da cena. Ana se lembra da frase de João e entende por que ele é tão popular.

Nada é mais importante do que a alegria, que é um recurso tão vital quanto a amizade.

João é um personagem inspirado no meu amigo Carlito Maia, grande publicitário e frasista brasileiro que numa certa altura da vida, se tornou afásico. Um homem para quem a palavra era essencial! Nada podia ser pior para ele do que perder a possibilidade de falar. Para ele e para mim, que gostava de conversar com Carlito. Só me conformei escrevendo o romance, me valendo da escrita, que alegra e faz viver.

Nadinha

Tive o sentimento de que o teatro francês renasceu com a peça de Olivier Py, Orlando ou a Impaciência, que faz a apologia da alegria e da juventude eterna - diz que esta depende daquela.

Tenho certeza de que é verdade, pois sei de um homem que dizia conversar com as células cancerosas do seu corpo e fazer as células rirem. Resistiu dez anos a um linfoma grave e morreu jovem com 78 anos.

Acho que é possível ser jovem até o último dia.

Para tanto, é preciso desacreditar da idade e nunca, nunca proferir a frase: “Com a minha idade”.

Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/educacao-sentimental/tenho-vocacao-para-a-tristeza-mas-acredito-demais-na-alegria/